Imagine acordar num abrigo criogênico após mais de dois séculos de silêncio glacial, empunhar seu Pip-Boy e pisar num mundo que ecoa o estrondo da destruição. Fallout 4 não é apenas um jogo, é um épico pós-apocalíptico que mistura o calor de um enredo pessoal com a vastidão implacável de um cenário irradiado.
Desenvolvimento: Bethesda Game Studios
Distribuição: Bethesda Softworks
Jogadores: 1 (local)
Gênero: RPG, Tiro
Classificação: 18 anos (drogas Ilícitas, linguagem imprópria, violência extrema)
Português: interface e legendas
Plataformas: PC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
Duração: 28 horas (campanha)/160 horas (100%)
O despertar no abrigo

Fallout 4 começa de uma maneira única, nunca vista antes em outro jogo da série Fallout e não inova somente nisso, mas em muitas outras coisas. Porém, a promessa de um enredo emocional logo se esbarra numa narrativa linear que equilibra drama familiar e conspirações genéricas. Embora a busca por seu filho dê pano pra manga, os momentos de tensão ocultos em laboratórios e ruínas perdem força diante de diálogos enjoados e uma voz de protagonista que matou qualquer chance de mergulho absoluto.
Produzido pela Bethesda Game Studios sob a direção de Todd Howard, o estúdio aproveitou sua Creation Engine para aprimorar sistemas de física, IA e renderização de ambientes, mantendo o DNA de mundo aberto que consagrou Skyrim e Fallout 3. Pela primeira vez na série, o protagonista ganhou voz própria, com mais de 111 mil linhas de diálogo gravadas, além de introduzir extensas mecânicas de construção de equipamentos e de assentamentos.
Fallout 4 bebeu diretamente da tradição pós-apocalíptica surgida com Fallout 1 e 2, incorporou lições narrativas de New Vegas e aprimorou elementos de RPG de ação experimentados em Fallout 3. A estética retrofuturista, inspirada em álbuns de jazz e publicidade dos anos 1950, contrasta com a tecnologia steampunk imaginada pela “Vault-Tec” e sintetizadores do Instituto.
Oficina atômica

Logo de cara, Fallout 4 abandona o clássico texto completo para adotar quatro respostas concisas encadeadas em um menu radial. A ideia era agilizar conversas e manter o ritmo — e, de fato, o jogo nunca paralisa para mostrar parágrafos imensos. Mas essa “eficiência” cobra um preço: as opções resumidas perdem nuances. Um simples “claro” pode significar apoio entusiasmado ou resmungo relutante, dependendo do tom que você imaginar. Para o jogo, porém, ambas as respostas são tratadas como equivalentes, dando peso nulo à interpretação pessoal.
O combate em Fallout 4 é uma coreografia de acertos e travamentos. No papel, V.A.T.S. oferece mira assistida com parafernália de slow-motion, mas, na prática, congela o ritmo em tiroteios acirrados. A exploração, embora rica em loot e salas secretas, é minada por menus confusos, inventário inchado e perks distribuídos como fichas isoladas, sem construir builds orgânicos.

A construção de assentamentos foi o grande trunfo de Fallout 4, conectar paredes, gerar energia e plantar campos cultivados funciona como um simulador de paciência. Muitas vezes, peças se recusam a encaixar sem ajustes micrométricos, travamentos explodem quando você acumula mais do que meia dúzia de objetos. O crafting de armas, por sua vez, oferece customização quase infinita, coronhas, silenciadores, lunetas e mais, mas entope menus e submenus, forçando você a recuar sempre que quer apenas adicionar um cano de maior calibre.
Ermos em 4K

No Xbox Series X e PS5, a atualização de nova geração coloca texturas polidas em resolução 4K em Fallout 4, mas escancara as rugas da Creation Engine. Rachaduras no asfalto, mato seco e reflexos de poças irradiadas ganham definição cinematográfica. Ainda assim, o que impressiona em primeiro plano desmorona à distância: pop-ins repentinos de NPCs surgem do nada, vegetação pisca como lâmpada incandescente e rochas emergem do chão com atraso. Fallout 4 parece um quadro bonito, mas com bordas brutas. A fé na ambientação vacila quando paredes e estruturas reaparecem à medida que você se aproxima.
A trilha de Inon Zur equilibra momentos de suspense orquestral com clássicos vintages que tocam no rádio do Pip-Boy, criando contraste entre melancolia e nostalgia. O chiado do transmissor, os lamentos de synths e o estrondo de miniguns pulsam mas nem sempre se coordenam. Em headsets sem fio, o áudio espacial falha em evidenciar a direção de tiros, e alguns efeitos ambientais repetem-se num loop cansativo. No timbre, Fallout 4 abraça o espírito dos anos 50, mas coça a alma de quem busca trilha que evolua junto com a jornada.
No fim das contas
Fallout 4 no Xbox Series X entrega uma versão revitalizada de um clássico, com ganhos reais em performance e visuais, mas sem curar seus males de design. A experiência ainda pulsa com energia ao explorar o Commonwealth irradiado, e a trilha sonora mantém o papel de coadjuvante épico. No entanto, mecânicas repetitivas, IA limitada e escolhas de design questionáveis continuam a marcar presença.
Para quem visita o Wasteland pela primeira vez, Fallout 4 oferece um mergulho seguro em um universo maduro. Para veteranos, a atualização para PS5 e Xbox Series é mais uma chance de revisitar velhos amigos e inimizades, agora em maior fidelidade. Ainda que não seja o ápice do RPG de mundo aberto, permanece como uma obra influente e divertida.
Cópia de Xbox Series X adquirida pelo autor
Revisão: Júlio Pinheiro