Todos perguntavam para onde iria Hideo Kojima depois de sua saída conturbada da Konami em 2015. Ele acabou criando seu próprio estúdio, a Kojima Productions. Death Stranding foi anunciado pouco tempo depois como uma parceria entre a Sony e Hideo. Passaram alguns meses desde o seu lançamento para o PS4 e está quase saindo a versão para PC’s, e esse parece o momento exato para me aventurar nesse mundo.
Desenvolvimento: Kojima Productions
Distribuição: Sony Interactive Entertainment
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Ação e Aventura
Classificação indicativa: 16 anos
Português: Dublagem, legendas e interface
Plataformas: PS4 e PC
Duração: 40 horas (campanha)/ 112 horas (100%)
Conceitos e sistemas
A parte chata de jogos costuma ser as missões que estão só para inflar as horas, te mandam para um canto e depois para outro, sempre em busca de um objetivo que não agrega a história. Em Death Stranding essa é a mecânica principal, andar de um lado para o outro, pois você é um entregador de encomendas.
O modo como o Sam, o personagem principal, caminha é definido pela quantidade de cargas que carrega. Se tiver carregando muito peso o seu andar será muito difícil, ele vai ficar caindo e terá que se segurar na mochila para não perder o equilíbrio, e por consequência cansa mais rápido. Se carregar pouco peso torna-se mais fácil de andar e demora mais para se cansar.
O design do mundo foi pensado que essa movimentação tem de ser realizada e nas dificuldades de se carregar muito peso, mas ao finalizar uma missão conectamos um dos locais no mapa e liberamos todas as construções que outros jogadores fizeram.
O trajeto que inicialmente era complicado agora é mais fácil, pois cada jogador pode fazer uma construção pra ajudar ele e os outros, e a sensação de ser ajudado quando menos espera é muito boa.
Jogar Death Stranding foi muito divertido, não me importava se parecia que as missões fossem repetitivas, já que andar por esse mundo era muito bom. Pena que o mesmo não pode ser dito sobre o combate contra inimigos.
Combate desnecessário
Temos três tipos de inimigos: os MULAs, são entregadores que perderam a humanidade e o objetivo deles é roubar a sua carga, os homo demens, os terroristas, que farão de tudo para te matar, e também os EPs, que são a parte sobrenatural do jogo e estão ligadas ao Death Stranding.
O combate contra os EPs é quase sempre tenso, pois não podemos fazer movimentos bruscos, caso contrário somos capturados e levados para um outro mundo. Enquanto está na furtividade é bom e divertido, mas se for capturado fica chato, que nem combater os MULAs e terroristas. Quando isso acontece vira um jogo de tiro genérico e sem graça.
Quando inicia uma sessão dessas a minha vontade era de parar de jogar, não tem a mesma jogabilidade refinada como a movimentação tem, é repetitivo e não é prazeroso atirar. Parece que o Kojima não teve coragem o suficiente para criar um jogo onde a única mecânica era a de caminhar, ou ele quis agradar os investidores e colocou isso pra ficar mais “vendável”.
As sessões de combate seriam melhoradas se o jogo tivesse um sistema de save melhor, pois na maioria das vezes ele não salva e nem te deixa salvar, fazendo o combate mais repetitivo do que já é. Ele não é de todo ruim, você fica bom quando se acostuma com ele, só é desnecessário. Mas a parte realmente problemática do jogo não é essa, é a história.
História Problemática
A premissa básica de Death Stranding é que você, Sam Porter Brigdes, tem que ligar todas essas cidades e trazer a união para a América, e no meio desse processo também salvaria a sua irmã que está sendo mantida refém pelo grupo terrorista. Somente você pode fazer isso e trazer a unidade nesse momento em que todos estão tão desconectados uns dos outros.
É bem simples e a maioria das histórias em videogames também são, mas o modo como ela é contada que é o maior problema. Explicações são feitas duas ou três vezes durante o mesmo diálogo, não existe sutileza nas interações, quase não tem desenvolvimento de personagem durante todo o jogo e são poucos que demonstram ter um arco bem escrito.
Sem contar que a maioria dos diálogos na verdade são monólogos, pois só um fala e o outro fica lá acenando com a cabeça. A pessoa acaba de contar uma história muito triste sobre sua vida e quase não tem reação. Isso provavelmente se deve a ele ter atores famosos e caros, não deve ter tido tempo pra gravar tudo, mas um planejamento melhor já resolveria boa parte.
Os atores realmente estão dando o seu melhor com o texto que tem, principalmente a Margaret Qualley e o Mad Mikkelsen, mas o roteiro é muito fraco e expositivo de mais. Essa é com certeza umas das histórias que mais subestima o seu público que conheço.
Robert McKee, um professor sobre escrita criativa e roteiros diz em seu livro Story o seguinte: “Quando pessoas talentosas escrevem mal, é geralmente por um desses dois motivos: ou foram cegadas por uma ideia que se sentem compelidas a provar, ou são guiadas por uma emoção que precisam expressar.” Realmente acho que o Kojima tem seu talento pra criar conceitos e até roteiros, mas nesse caso ele queria provar alguma coisa.
Seja mostrar pra Konami de “olha o que você perdeu” ou pra tentar lançar a sua carreira nos cinemas, mas ele se prende muito a fórmulas e esquece de contar uma boa história. Isso é completamente imaturo e ignorante da parte dele, como artista, por achar que só isso bastaria para ser considerado bom.
Isso me lembra outra parte de Story: “Assim como crianças quebram objetos para se divertirem ou têm acessos de raiva para chamar atenção, muitos cineastas usam artifícios infantis na tela para gritar “olha o que eu sei fazer!” Um artista maduro nunca chama a atenção para si mesmo, e um artista sábio jamais faz algo meramente por que isso quebra convenções.”
Hideo Kojima não é o cineasta da frase, mas é o diretor, game designer, roteirista, entre outras funções. Inclusive só por querer fazer praticamente tudo já demonstra uma certa imaturidade ou falta de humildade, porque poderia muito bem chamar alguém para ajudá-lo, mas não fez por ego. Outra coisa que a história faz de errado e essa eu preciso destacar, é o fascínio pelos Estados Unidos.
Glamourização dos Estados Unidos
Poderíamos esperar de um estadunidense que ele fosse nacionalista e exaltasse o seu país, como muitos fazem em todo tipo de arte, às vezes fazem até reparação histórica para deixar sua nação como heróis do mundo. O que não faz muito sentido nesse caso, já que o Kojima e sua equipe são japoneses, então vamos tentar entender.
Durante o jogo vemos que “Se a América está bem, então o mundo está bem” e “O mundo precisa da América” e etc. Essa é mensagem mais inocente que alguém poderia colocar em seu jogo, ainda mais quando isso não é necessário para a história principal.
A frase “make America whole again” é dita e repetida inúmeras vezes, e é claramente uma alusão ao slogan de Donald Trump durante a eleição, “make America great again”. É com essa frase que começamos a entender mais a real intenção do Kojima de se colocar como uma obra paralela à realidade, mas uma mensagem inocente demais para o atual momento.
É muita ingenuidade acreditar que os Estados Unidos são tudo isso, ainda mais sabendo de tudo que acontece, e ainda tenta passar essa imagem de “somos os heróis”. Essa mensagem está aqui tanto para aprovação no maior mercado, quanto para uma falsa esperança de que se a gente se unir “tudo é possível”. Volto a falar, isso não faz muita diferença na história e está aqui só por isso.
Death Stranding é um jogo que acerta muito em sua movimentação e de fazer disso o loop de jogabilidade, é de longe a melhor parte, inclusive acabei ele em 4 dias porque ele é muito gostoso de se jogar. Mas quando entramos na história vemos o principal problema do Kojima, o ego.
Realmente penso que ele acha a sua narrativa a mais profunda, cheia de metáforas e conceitos inteligentes, só que é muito rasa e os conceitos mais batidos são expostos de uma maneira burra. O que é ruim, porque tinha tudo pra ter uma boa história, tem ótimos atores, orçamento e ainda consegue falhar na execução.
Esta review foi feita com uma cópia de PS4 adquirida pelo autor
Revisão: Samuel Leão