Em 2021, longos 22 anos após o lançamento do jogo original, New Pokémon Snap aparece para finalmente renovar uma experiência marcante. Naquela segunda metade dos anos 1990, um projeto de jogo baseado em fotografia, e que não parecia oferecer muita motivação para o jogador, se mesclou à franquia Pokémon. Em um momento de crescimento meteórico dos monstros de bolso, isso foi o suficiente para tirá-lo do papel e torná-lo em um spin-off inovador e deslumbrante, apesar de curto.
Quando a Nintendo anunciou New Pokémon Snap, o segundo da série, além da empolgação dos velhos fãs e curiosidade de novos jogadores, algumas questões apareceram: o que pode ser feito desta vez para que a motivação de ver os Pokémon em seu habitat natural preserve o deslumbramento e novidade do jogo original? E o que pode ser trazido como novidade, fazendo com que ele se sustente por si só, como uma experiência original?
Desenvolvimento: Bandai Namco
Distribuição: Nintendo
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Simulação
Classificação: Livre
Português: Não
Plataformas: Switch
Duração: 10 horas (campanha)/24.5 horas (100%)
Viagens “philosophicas” ao Arquipélago de Lental

O arquipélago de Lental é a região na qual se desenrolam as ações em New Pokémon Snap. No início, o protagonista se apresenta ao laboratório do Professor Mirror, o cientista que conduz as investigações sobre a região. Ao contrário dos professore dos jogos principais da série, sua proposta não é completar a Pokédex através da captura e evolução das criaturas, mas o registro fotográfico de seus diferentes comportamentos em uma enciclopédia própria, a Photodex.
O professor Mirror pretende seguir um trabalho iniciado por Capitão Vince, figura histórica da região, um explorador naturalista. Ainda que se faça apenas uma referência ao capitão e a suas descobertas, ele não é citado à toa. Toda a experiência parece se aproximar das expedições científicas que viajantes (geralmente europeus) realizavam ao chamado “novo mundo” para conhecer e registrar a fauna e flora, a geografia e até os costumes das populações locais.
O que New Pokémon Snap oferece é a experiência de se sentir um explorador, observando e interagindo com criaturas vivas. Em nenhum outro jogo da franquia os Pokémon se apresentaram de forma tão orgânica e natural, como seres vivos. Entre todas as fases, praias, desertos, vulcões, montanhas nevadas, cavernas, florestas densas, nenhum Pokémon parece fora de lugar: há sempre correspondências entre clima, período e a atividade desenvolvida por eles.
Há ainda outra vantagem: se a atividade real de observação de seres vivos demanda paciência e espera pelo momento em que, finalmente, será possível ver alguma atividade, nas fases do jogo há um excesso de atividade todo o tempo. Enquanto Pichu e Grookey brincam correndo pelo cenário, Bouffalants pastam e uma família de Bidoofs constrói um ninho. Emolga passa como um raio enquanto Swanna e seus Duckletts boiam em fila indiana.
Câmera em mãos e o mistério luminoso

O protagonista recebe do Professor Mirror uma câmera fotográfica e o acesso ao NEO-ONE, um veículo híbrido que o conduzirá por terra e água em cada cenário. A forma de jogar é bastante simples e intuitiva, repetindo (talvez até demais) a jogabilidade do Pokémon Snap original. Como anteriormente, você é conduzido pelo veículo em um trajeto pré-estabelecido. Sua única preocupação é ficar atento ao seu entorno, controlando a câmera com os dois direcionais – o direito para movimentos maiores e o esquerdo para ajustes finos e indicação do Pokémon que estará no foco da imagem. Através do botão ZL é possível dar zoom na imagem.
Além desses controles, aos poucos, e à medida em que a história progride, o jogador recebe outras habilidades, como arremessar uma fruta, escanear a área em busca de segredos (o que também chama a atenção de alguns Pokémon) e tocar uma melodia. Em cada uma das ilhas do arquipélago, é possível ainda que as fotografias ajudem o professor a desenvolver Illumina Orbs específicos de cada local. Essas esferas luminosas reproduzem um fenômeno misterioso descrito inicialmente pelo Capitão Vince, e que se torna o principal mistério aqui.
Embora exista uma variedade de formas de interação com o ambiente, isso apenas atualiza o que era possível no Pokémon Snap original, sem apresentar nada que seja percebido como uma grande novidade. Em muitos momentos, é preciso ir por tentativa e erro para descobrir os efeitos específicos de cada um dos comandos nos Pokémon que se quer fotografar, especialmente quando buscamos cumprir os pedidos específicos do Professor Mirror e dos demais personagens: a assistente Rita, o jovem rival Phil e Todd Snap, e o protagonista do jogo original que se apresenta como um fotógrafo de Pokémon profissional. Esses pedidos funcionam como side quests, objetivos secundários para a aventura que podem ser um tanto confusos sobre como alcançá-los.
Outro dificuldade que interfere na experiência é o arremesso tanto da fruta quanto das esferas luminosas. Esses objetos parecem ter propriedades físicas confusas, o que deixa a mira imprecisa e atrapalha a busca por imagens que demandam interações específicas com algumas criaturas. As frutas, por exemplo, descritas como doces e macias, ora boiam na água ora afundam e podem tanto nocautear certos Pokémon quanto ser ignoradas por outros.
Ajustes de foco

Ao final de cada fase, o Professor avalia uma imagem de cada Pokémon fotografado. Você pode manualmente escolher quais imagens quer mostrar, ou pode pedir que o jogo automaticamente selecione aquelas que contêm cenas inéditas, e então elas receberão uma boa avaliação. Esse é um momento chave que me trazia preocupação antes do lançamento. No Pokemon Snap original, lembro de sentir uma diferença entre o que eu considerava uma boa foto e o que o sistema de avaliação transformava em pontos. Essa não é uma tarefa simples, afinal critérios objetivos de avaliação de uma imagem não são suficientes para dar conta do que nós, humanos, em toda nossa diversidade de culturas e referências, entendemos como belo.
Nesta nova versão, entretanto, ainda que os critérios sejam objetivos – tamanho, centralidade do pokemon na imagem, direção, comportamento e pontos de bônus pelo cenário ou pela presença de outras criaturas – não senti que as avaliações eram injustas. Isso é muito importante para manter a liberdade do jogador de fotografar o que lhe parece interessante em vez de se preocupar em buscar sempre imagens que o jogo avaliará bem. E, como um incentivo para a criatividade do fotógrafo, é permitido salvar imagens em um álbum pessoal, mesmo que não tenham sido avaliadas pelo professor.
Ainda que não seja injusta, a avaliação das fotos funciona de uma forma contraintuitiva. Cada Pokémon deve ser fotografado de quatro maneiras para completar a Photodex, o que é caracterizado como uma quantidade de estrelas. Elas representam a raridade do comportamento registrado. Já a qualidade da foto é avaliada por um sistema de pontos que se traduz na classificação das estrelas em bronze, prata, ouro ou platina. A quantidade de estrelas de uma foto, ainda que seja a classificação mais aparente, não necessariamente condiz com a qualidade da imagem, o que pode gerar confusão.
A soma dos pontos das fotos, ao fim do percurso, serve para aumentar o nível de cada fase e modificar as espécies e comportamentos que podem ser encontrados. Esse é um aspecto muito importante porque renova o interesse e ameniza a repetição inevitável de passar pelos mesmos locais em busca das melhores fotos. Também é essa pontuação, somada ao registro de alguns elementos das fases, que garante o progresso, liberando novos percursos na mesma área (como variações de dia e noite) e outras ilhas do arquipélago. O processo de desbloqueio de novas áreas e da sequência da história não é muito claro, mas acaba acompanhando o progresso natural do jogador.
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O cuidado que New Pokémon Snap destina às animações dos Pokémon e dos ambientes visitados não se repete nos momentos em que a história progride. Os personagens recebem uma dublagem parcial, o que até remete ao monossilábico professor Carvalho do jogo original, mas aqui soa apenas antiquado. Um suposto apelo à nostalgia não é suficiente para justificar essa limitação.
Por outro lado, o que o jogo apresenta de mais inovador certamente era um sonho de quem 22 anos atrás jogava o game do Nintendo 64: a capacidade de mostrar para os amigos e para o mundo suas fotografias. New Pokémon Snap oferece várias ferramentas para a produção de imagens que funciona independente do sistema principal de pontuação. Os jogadores, ao final de cada fase, podem não apenas salvar suas fotos preferidas, mas também tirá-las novamente, com ajustes de ângulo, luz e foco. A isso se soma a possibilidade de edição das fotos, com aplicação de filtros, adesivos e molduras.
Essas produções oferecem uma nova camada, mais social e interativa, com um sistema interno de compartilhamento de imagens e a integração com a galeria do Nintendo Switch (que permite a publicação de imagens no Twitter). O grande trunfo desse modo de jogo é permitir que os jogadores experimentem as fases a partir de seus próprios critérios e de sua própria criatividade. New Pokémon Snap é um game contemplativo: demanda a paciência de observadores da natureza e a criatividade e astúcia de um fotógrafo. Para mim, é ideal para jogar um pouco por dia, relaxar e admirar esse universo. Para outros gostos, pode ser repetitivo e entediante. De qualquer forma, se renova o deslumbramento de ver os Pokémon como criaturas reais, seres vivos em um mundo verossímil. Isso não é menos que admirável.
Cópia de Switch adquirida pelo autor
Revisão: Jason Ming Hong
New Pokemon Snap
Prós
- A melhor representação dos Pokémon como criaturas reais
- Quantidade e variedade de Pokémon e fases é muito maior que o jogo original
- Edição e compartilhamento de fotos traz uma nova camada à experiência
Contras
- Dublagem incompleta
- Avaliação e progresso confusos
- Repetição é parte do jogo e pode ser entediante