Scott Pilgrim capa

Review Scott Pilgrim vs. The World: The Game Complete Edition (Switch) – O retorno de um clássico cult

Em meados de 2010, quando eu estava com 16 anos, meus pais decidiram alugar Scott Pilgrim vs. The World para assistirmos. Foi um desastre. Achei o filme ridiculamente bobo, bizarro, sem nexo e simplesmente não fui com a cara de Michael Cera no papel de Scott. Essa era minha visão da obra, que na verdade tem origem nos quadrinhos e o filme nada mais é do que uma mera adaptação – coisa que eu não fazia ideia. Anos depois, ouvi falar muito bem de Scott Pilgrim vs. The World: The Game ainda na geração Xbox 360 e PS3, porém era tarde demais: o jogo já havia sido removido das lojas online.

Em minha sede de conhecer o motivo de tantos elogios serem feitos a este indie de Beat ‘em Up, decidi me aventurar no mundo da emulação, que era a única forma de jogá-lo naquele momento. Foi uma droga. Haviam vários engasgos, glitches visuais, sons com problemas, etc. De fato, não foi uma experiência nada boa.

Eis que chegamos em 2020 e recebemos a gloriosa notícia de que Scott Pilgrim voltaria aos consoles de última geração no fim do ano, mas acabou sendo adiado para o início de 2021, provavelmente, por receio de ser lançado junto com o famigerado Cyberpunk 2077. Enfim, o jogo chegou, e pude ter a experiência real desta vez, mas até onde vale a nostalgia das pessoas em relação a este título?

Desenvolvimento: Ubisoft Montreal
Distribuição: Ubisoft
Jogadores: 1-4 (local e online)
Gênero: Luta, Ação, Multiplayer
Classificação: 12 anos
Português: Não
Plataforma: PC, Xbox One, PS4 e Switch
Duração: 4 horas (campanha)/ 12.5 horas (100%)

Um jogo sem grandes explicações

Ramona e Scott

Scott Pilgrim vs. The World: The Game Complete Edition é um jogo complicado de se ter contato sem antes ter consumido os quadrinhos, e digo isso por experiência própria. Por conta do filme, tenho alguns flashes de memória que me fazem lembrar vagamente da história. Na verdade, eu só tinha em mente que Scott precisa lutar contra ex-namorados malvados de sua atual namorada, Ramona, se quiser continuar com ela. Essa informação não é suficiente, na minha opinião. Chegando quase na última fase, fiquei bastante curioso para entender mais sobre o que estava acontecendo. Foram divertidas as mecânicas de Beat ‘em Up, lutas marcantes contra chefes, elementos de RPG, etc. Porém, sentia que faltava algo.

Logo de cara já fica minha recomendação aqui: leia os quadrinhos antes de jogar este jogo. Sério. Não que você vá ficar completamente perdido, afinal é um game de briga de rua, que não se preocupa muito em se aprofundar na história. Mas, uma vez que você tenha lido pelo menos uma boa parte dos quadrinhos, sua visão sobre aquele universo será outra.

Ex-namorados

Scott Pilgrim vs. The World, de Bryan Lee O’Malley, é uma obra incrivelmente divertida e bem-humorada, que conta a história de Scott Pilgrim, um rapaz que mora em Toronto, no Canadá, em um pequeno quarto/kitnet com seu amigo gay, Wallace, que banca praticamente todas as contas no recinto.

Um belo dia, Scott começa a ter sonhos com uma garota de cabelo colorido, e descobre depois que ela realmente existe e trabalha como entregadora da Amazon. Em sua tentativa obsessiva de tentar sair com essa garota, o protagonista faz um na loja virtual da empresa apenas para receber sua visita. Com isso, tem início uma série de desafios que Scott precisará enfrentar para continuar sendo um casal com Ramona, a garota de seus sonhos – literalmente. É uma história absurda, que beira o surreal e que não se leva a sério. O filme traduz isso de uma forma terrível que acaba se tornando vergonhoso.

Briga! Briga! Briga!

Treta!

Voltando nossa atenção ao jogo, Scott Pilgrim vs. The World: The Game é um divertido título de ação e luta com elementos de RPG, esses dois primeiros gêneros que basicamente resumem o termo Beat ‘em Up Basta andar pelo cenário de forma lateral para avançar, derrotar inimigos na base da força e fazer uso dos mais diversos golpes para tirar todos do seu caminho. Os personagens principais do universo de Scott Pilgrim estão disponíveis para seleção desde o início, como o próprio Scott, Ramona, Stills, Kim, Wallace e Knives (que é liberada apenas fazendo login no Ubisoft Connect).

Apesar da grande quantidade de selecionáveis, todos são iguais e possuem as mesmas formas de jogabilidade, ao contrário de alguns games da concorrência que se aprofundam bem mais no quesito “diferenciação”. Através de experiência adquirida, o personagem sobe de level e aprende novos golpes, sendo possível chegar até o nível 16. Além disso, nas lojinhas são vendidos alimentos e outros itens que servem para aumentar seus atributos, como força, velocidade, defesa e “força de vontade” (aqui, chamado Willpower). Ah, e o idioma em Pt-Br não está disponível, esses termos acima foram citados em português para ficar mais fácil.

Mercadinho

Força, velocidade e defesa falam por si só em relação aos seus efeitos, já Willpower serve para que o personagem restaure sua saúde sem perder uma vida, e serve como uma espécie de chance extra. Por isso, manter o valor dessa barra sempre alta é garantia de mais chances de se manter vivo.

Já se tratando das mecânicas de Beat ‘em Up em si, elas fazem um trabalho decente considerando a época em que o jogo foi lançado originalmente (2010). Muitas vezes senti imprecisão nos golpes e dificuldade de movimentação pelo cenário – possivelmente, ritmo cadenciado demais. Também não há um comando dedicado ao agarrão dos inimigos, e nem sempre parece que este movimento funciona, o que pode ser impressão minha, mas o comando soco + direita costuma falhar e resultar em um ataque comum.

O início é um pouco frustrante, já que nem todos os movimentos estão liberados, além dos combos que são extremamente curtos. Diria que o único golpe sequencial de verdade é o soco fraco seguido de um soco forte, ou seja, um combo de dois comandos apenas. Infelizmente, nesse quesito, Scott Pilgrim vs. The World: The Game acaba deixando muito a desejar e acaba perdendo feio pra concorrência que já faz bem melhor atualmente – e até mesmo na época. O resultado? Formas demasiadamente repetitivas de enfrentar inimigos.

Adição do online

Modo online falho

Uma grande benção e maldição de Scott Pilgrim vs. The World: The Game, em relação ao jogo original de 2010, certamente é o modo online. A versão de Xbox 360 e PS3 era dotada apenas de multiplayer local, então, para se adequar aos tempos modernos, foi incluído o multiplayer com amigos e pessoas aleatórias, com a opção de enviar convites para alguém de sua lista de amizade.

Porém, como falei acima, o online veio bastante comprometido desde o dia do lançamento. Jogar com pessoas fora de sua região é completamente inviável, então pode esquecer de experienciar Scott Pilgrim vs. The World: The Game com alguém que não seja do Brasil. O input lag é tão incômodo que você aperta para andar e, cerca de 2 segundos depois, o jogo executa a ação. Mas não para por aí, são desconexões constantes, erros e crashes que me deixaram irritado de uma forma que tive que ser muito insistente para conseguir a proeza de jogar com alguém que não fosse de forma local. Quando dei a sorte de encontrar pessoas aleatórias, vi um por um sendo desconectado da sessão até que, quando o último caiu, a partida foi encerrada (mesmo eu sendo o criador/anfitrião).

Quando finalmente consegui encontrar um amigo que mora no Brasil, a decepção foi um soco no estômago: não existe uma forma de avançar na história jogando online, porque todas as fases estão liberadas e a experiência se torna em algo arcade, sem progresso ou qualquer coisa do tipo. Está empacado em alguma fase? Então vai precisar colocar alguém do seu lado no sofá pra pedir ajuda.

Decisões péssimas

KO!

Verdade seja dita: Scott Pilgrim vs. The World: The Game é um jogo difícil. Não diria que é injusto, mas apenas que possui picos de dificuldade que abusam da sua boa vontade. O pior é não poder diminuir o nível de dificuldade ou ativar opções de acessibilidade, causando uma restrição para que apenas pessoas habilidosas e insistentes consigam dominar o game. A maior razão disso é a falta de checkpoints, então, depois que perder a última vida, você será jogado para o mapa novamente e precisará começar do início daquela fase. 

Isso fica bem claro nos momentos finais, em que é necessário passar por uma horda bastante chata de inimigos variados, desviar de projéteis enquanto evita precipícios em uma área extremamente favorável para quedas, e então enfrentar três versões de um chefe. Muita gente diz que os games estão ficando fáceis demais nos dias de hoje, mas, novamente, isso nem de longe é um problema quando você oferece opções para quem está jogando.

O online e o co-op local também não ficam de fora dessa equação. Enquanto localmente não é possível entrar ou sair a qualquer momento do jogo, sendo necessário voltar ao menu principal para tal, jogar através da internet também não oferece pesquisa de salas e ingressar numa fase em progresso. Se você pensar que esse modo foi adicionado apenas agora no relançamento, é uma completa vergonha imaginar que alguém não pensou em recursos tão essenciais. Além disso, apesar dessa edição ser a versão completa com todos os modos extras como o Battle Royale, horda de zumbis, queimada e arena de combate, estas formas de jogo só podem ser experienciadas localmente. 

Um bom jogo com escolhas ruins

Essa aí é de cortar a mão

Scott Pilgrim vs. The World: The Game Complete Edition é um alívio para quem ansiava pela volta do jogo e não pode comprá-lo até 2014, época em que foi removido das lojas digitais. Felizmente, pude conhecê-lo graças à sua volta, então sou mais do que grato por essa oportunidade de experienciar um título que tomou o coração de seus fãs.

Por outro lado, apesar do relançamento ter vindo com a premissa de adicionar o online e trazer todo o conteúdo extra lançado na época, decisões ruins já citadas e falta de opções de acessibilidade fazem com que Scott Pilgrim vs. The World: The Game seja um jogo que não faz nada de incrível, perde para sua concorrência até mesmo mais antiga – Castle Crashers (2008) – e falha miseravelmente por não oferecer uma forma de entender o universo de Scott Pilgrim. Por que não incluir uma versão digital da HQ nos extras? Ou pelo menos cenas animadas utilizando recortes dos quadrinhos como fizeram no filme em 2010?

Como falei, não vá sem conhecimento prévio do que está jogando, pois o carisma será praticamente nulo, você não entenderá nada do que está acontecendo e sua única diversão será bater em bonecos nas ruas de Toronto e enfrentar os ex-namorados de Ramona, sem nem compreender o porquê Scott se sujeitou a isso – sem falar que perderá todas as referências.

Extra: se você jogar com o Wallace, por exemplo, na loja do Wallace você também encontrará o Wallace como vendedor. O jogo não se preocupa com esse tipo de coisa.

Cópia de Switch cedida pelos produtores

Revisão: Kiefer Kawakami

Scott Pilgrim vs. The World: The Game Complete Edition

6

Nota final

6.0/10

Prós

  • Visuais caprichados
  • Trilha sonora incrível
  • Todo o conteúdo extra incluído
  • Modo online

Contras

  • Decisões péssimas
  • Online terrível
  • Picos frustrantes de dificuldade
  • Zero opções de acessibilidade
  • História completamente ausente