Jogos de sobrevivência são famosos por sua longa duração e alta dificuldade, podendo inibir jogadores mais casuais da cena do gênero. Ao mesmo tempo pode afastar quem prefere um grau maior de desafio, ou até mesmo pela falta de fidelidade à realidade que o gameplay possa apresentar.
Numa junção destas duas vertentes, a Hinterland Studio traz The Long Dark, um game de sobrevivência com predominância em história e bastante conteúdo extra. Lançado originalmente em 2017 para PC e Xbox One, The Long Dark finalmente faz sua aparição no console da Nintendo. Bom, agora podemos ter todo o mundo pós-apocalíptico canadense na palma de nossa mão. Mas será que é pra todo mundo?
Desenvolvimento: Hinterland Studio
Distribuição: Hinterland Studio
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Aventura, Sobrevivência
Classificação: 12 anos
Português: Interface e legendas
Plataforma: Switch, Xbox One, PS4 e PC
Duração: 17.5 horas (campanha)/ 153 horas (100%)
Um mundo congelante
Em The Long Dark é possível iniciar o jogo no modo História, Sobrevivência ou Desafios. Todas as três formas de jogar estão disponíveis desde o início, sem precisar finalizar o enredo ou qualquer coisa do tipo. O Sobrevivência permite escolher entre dois sexos do personagem, e basicamente é um modo livre que utiliza cenários vistos no modo História em conjunto com todas as ferramentas disponíveis para crafting – o que no enredo é liberado conforme progresso acontece. Já os Desafios são justamente objetivos focados para testar o jogador, como sobreviver por uma quantidade específica de dias sob determinadas condições e circunstâncias.
O modo História se chama Wintermute, possui três capítulos e serve principalmente para ensinar – ou pelo menos tenta – o jogador sobre como funcionam as mecânicas e a melhor forma de sobreviver. The Long Dark se passa num local pós-apocalíptico onde o mundo sofreu um desastre natural e nada mais funciona à base de energia elétrica, forçando as pessoas a buscarem métodos mais arcaicos de produção de energia. O fogo será um de seus melhores amigos em toda a trajetória de sobrevivência. Aqui você controla Will Mackenzie, um rapaz que vive sozinho em seu pequeno hangar. Numa certa noite, uma antiga amiga, Astrid, surge em sua moradia pedindo uma ajuda repentina, juntamente à sua maleta com um conteúdo desconhecido e misterioso, o qual a moça se recusa a revelar e praticamente obriga o rapaz a não fazer perguntas sobre.
Mesmo com a aparição acompanhada de um pedido desesperado de ajuda após anos sem manter contato, Will resolve ajudar a moça com o objetivo de levá-la até uma ilha chamada Grande Urso, onde ela precisa levar a maleta. Então, ambos partem no avião monomotor do protagonista rumo ao local de destino. Porém, no caminho, Will e Astrid discutem enquanto uma fortíssima nevasca atinge o veículo e o pouso forçado resulta em um acidente terrível. Após a cutscene, Will acorda sozinho, com um destroço enfiado em uma de suas mãos e seu avião pegando fogo. Então a jogabilidade tem início.
O protagonista precisa encontrar Astrid, mas percebe que está em péssimas condições. Por isso, antes de iniciar sua jornada, é necessário aprender o básico para sobreviver e cuidar de suas necessidades fisiológicas como sono, frio, fome e sede. O mais interessante em The Long Dark é que toda e qualquer ação tem a “penalidade” de um tempo para ser realizada, além de que, na medida do possível, exige detalhes mais profundas para sua execução. Por exemplo, para cozinhar qualquer coisa é necessário acender a fogueira (com uma taxa de sucesso medida em porcentagem), posicionar a comida/carne na pedra ao redor da mesma e aguardar o tempo necessário para que o alimenta seja cozido. O processo pode ser acelerado se usarmos uma panela ou outro recipiente – de acordo com o tamanho da comida -, assim o cozimento é feito mais rapidamente. Porém, esse tempo gasto também faz com que o tempo avance enquanto que a sede e o cansaço vão se elevando proporcionalmente tentando refletir a realidade.
Uma pitada de realismo
Apesar de parecer bastante profundo em certos pontos, The Long Dark acaba escolhendo não ser tão imersivo em outros. Não existe uma animação para ações como o próprio cozimento de alimentos mencionado anteriormente. Também falta o mesmo para a ebulição da água, costura de roupas, ingestão de remédios e afins. Tudo é apresentado com uma barra de carregamento simulando e descrevendo a ação realizada. Por outro lado, o recarregamento das armas é feito bala a bala – por exemplo -, um detalhe bastante bem-vindo para manter o clima de sobrevivência.
Porém, este nível de realismo pode ser uma faca de dois gumes em vários momentos já que vai atrair pessoas mais apaixonadas por este tipo de jogabilidade enquanto afastará aqueles que tem preferência por algo “mais video game“. Numa busca por remeter à vida real, The Long Dark não é muito compreensivo na hora de ensinar o jogador através de tutoriais.
Sem falar que apresenta mecânicas de contusões, ferimentos, infecções e dores em geral. Isso acaba sendo bem irritante em certos pontos e até mesmo funcionando de forma imperfeita. Um grande exemplo sobre isso é a altura da qual o personagem pode cair. Por diversas vezes o jogo simplesmente supôs que eu havia caído de uma altura suficiente para machucar meu personagem, porém claramente isso foi fruto de uma má programação de distanciamento entre o protagonista e uma superfície. Outro incômodo neste quesito é o fôlego do personagem, que limita as corridas em distâncias extremamente curtas, fazendo com que o jogador apele para um “macete” e utilize o recurso “passar o tempo” para recuperar a stamina – com punição de passagem de tempo, obviamente.
Já se tratando de exploração, The Long Dark se preocupa tanto em ser realista que acaba não oferecendo uma opção de viagem rápida ou mapas mais claros e informativos. Não há nem mesmo um mini mapa aberto no canto da tela, exigindo que toda vez o menu radial seja a única forma de ver sua distância em relação ao destino. Não existe uma forma de mudar nada disso, já que apenas os pontos pelos quais você já passou é que ficarão registrados sem tantos detalhes úteis. Por isso, não é difícil acabar vagando por horas sem saber exatamente seu objetivo.
Problemas estranhos
Foi o que aconteceu comigo: me perdi. Fiquei cerca de 5h vagando pelos cenários do jogo, quando acabei buscando algum guia na internet e percebi que fui parar em um local indevido, portanto acabei provavelmente quebrando o jogo sem ativar a cena necessária para avançar na história a fim de partir para o capítulo 2. Em meu save, constava que o capítulo 1 estava com 95% sua conclusão. Comprovei isso selecionando para iniciar o jogo a partir do segundo capítulo, então pude perceber que, realmente, não havia uma forma de finalizar a primeira parte do jogo. Eu estava basicamente preso e precisava iniciar do capítulo 2 “zerado”, sem todos os recursos adquiridos até então. Entrei em contato com os desenvolvedores para confirmar esta suposta falha, mas não obtive resposta até a publicação desta análise.
Também pode ser que muitos jogadores sintam que The Long Dark acaba sendo um Walking Simulator em muitos momentos, já que distâncias bem grandes são o que separam um objetivo do outro. Por outro lado, para quem gosta de exploração, crafting e sobrevivência, o jogo com certeza é fenomenal e bastante imersivo. Mesmo assim, mais opções para tornar tudo menos cansativo poderiam ter sido incluídas.
O port para Switch
Entrando agora numa das partes mais interessantes e impressionantes, a resposta para essa pergunta que você possivelmente está se fazendo é sim: The Long Dark é bem competente no Switch. A versão para o console da Nintendo é impressionante, mas talvez tenha sido de grande ajuda para o hardware os gráficos mais cartunizados que o jogo apresenta, exigindo bem menos do processamento.
A performance também é boa, se mantendo frequentemente em 30 fps. Por outro lado, é possível ver alguns objetos se formando longe da visão do personagem – uma prática bem comum em ports para Switch que evita a queda de fps. Porém, a técnica aplicada aqui para amenizar esse efeito é de qualidade, e faz com que a impressão é de que uma espécie de névoa bem fina está cobrindo os elementos no horizonte. Felizmente isso é favorecido pelo clima frio apresentado nos cenários. Já as texturas não tem muito do que reclamar. Apesar de sacrificadas, são dignas e não chegam a ser horrorosas, apenas inferiores às versões de Xbox One e afins.
Não é pra todos, mas mira no público certo
Claramente The Long Dark é um jogo feito pensando nos amantes de exploração e crafting. A experiência proporcionada é incrível e certamente você passará longas horas explorando a ilha de Grande Urso sem nem mesmo ver o tempo passar. Apesar de estarem disponíveis vários níveis de dificuldade, a jogabilidade em geral não vai agradar a todos, muito menos os mais impacientes e jogadores casuais. Sua forma de jogo demanda tempo e persistência, mas te recompensa com algo único e praticamente inexistente num console como o Nintendo Switch.
Esta review foi feita com uma cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Bia Bock