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Review Persona 5 Royal (PS4) – O GTA V da Atlus

Persona 5 foi concebido originalmente como um jogo para PlayStation 3, com lançamento previsto para 2013. Atrasado, foi lançado em 2016 para PS3 e PS4. Então, por que falar dele em pleno 2021?

Porque a Atlus, desenvolvedora do jogo, costuma lançar versões aprimoradas por meio de conteúdos adicionais. Esse é o caso de Persona 5 Royal (P5R), lançado em abril de 2020. P5R não é um DLC ou uma expansão tradicional pós-campanha; a Atlus adiciona seus conteúdos extras em meio à campanha principal, acrescentando personagens, situações, “chefões” e outros finais possíveis. 

São mais de 130h de conteúdo e muitas mecânicas diferentes entre si: há gerenciamentos de tempo, de recursos, de mão; há elementos de simulação social e visual novel. Pois é, o texto ficou longo, bom para quem gosta do gênero. Se você está em dúvida se Persona 5 Royal vale a pena, há um resumo no final.

Desenvolvimento: Atlus, P Studio

Distribuição: SEGA of America

Jogadores: 1 (local)

Gênero: RPG

Classificação Indicativa: 18 anos

Português: Não

Plataformas: PS4

Duração: 103 horas (campanha)/144 horas (100%)

O que é Persona 5 Royal?

A escola de Persona 5 Royal tem testes, inclusive de popularidade.
A escola de Persona 5 Royal tem testes, inclusive de popularidade.

Persona é uma franquia de JRPG (RPG japonês) derivada de uma franquia principal chamada Shin Megami Tensei. Tanto um quanto o outro tem como principal mecânica o combate em turnos. 

Em Persona, a ação acontece em um mundo “real” em que o protagonista vai à escola, participa de clubes acadêmicos, socializa com amigos e arruma empregos de meio período, ao mesmo tempo em que possui uma segunda identidade que permite explorar uma realidade – chamada Metaverso – repleta de demônios (as “sombras”).

É no Metaverso que ocorrem os combates. Em P5R as Personas são sombras do Metaverso que recuperaram sua consciência de que anteriormente “navegavam o mar no coração dos homens”. Apenas o protagonista do jogo consegue acumular e controlar mais de uma Persona; os demais elementos da equipe possuem uma única persona cada um.

A Academia Shujin

Faz café, mora no sótão do Café Leblanc desconhecemos os pais de Joker.
Coisas de Persona: desconhecemos os pais de Joker.

Quase tudo o que você ler nessa review se aplica à franquia de modo geral. Mas como o assunto é Persona 5 Royal, focaremos na entrada mais recente e aprimorada. A história de P5R se passa em Tóquio e é marcada pela passagem do tempo no calendário. O máximo de customização do personagem é seu nome – e eventualmente, os trajes no Metaverso. Nesse texto, ele será sempre chamado por seu codinome de ladrão-fantasma: Joker.

Assim, Joker é um jovem no Ensino Médio condenado judicialmente por ter agredido um adulto. Ele se muda para Tóquio e passa a viver no sótão do Café Leblanc, sob a guarda de um tutor, Sojiro, que deve mantê-lo afastado de problemas até que ele possa retornar para casa para os pais que o ignoraram o jogo inteiro. 

Os Phantom Thieves

Riyuji, Ann, Joker e o gato Morgana são os Phantom Thieves originais.
Riyuji, Ann, Joker e o gato Morgana são os Phantom Thieves originais.

Joker é, pelos padrões da sociedade japonesa, um pária – um desajustado por ter sido fichado como delinquente juvenil. Ele é discriminado pelos colegas e por professores da Academia Shujin, sua nova escola – menos por aqueles que, assim como ele, também são desajustados e marginalizados: Ryuji Sakamoto (expulso da equipe de atletismo) e Ann Takamaki. 

Contudo, Persona 5 Royal se torna ainda mais desconfortável quando se descobre que a condenação de Joker foi injusta e que tanto Ryuji quanto Ann são discriminados por culpa da violência e do assédio cometidos por um mesmo professor. O desajuste da nova geração e sua exploração por parte dos adultos é o tema central em P5R. 

Apesar dos personagens adolescentes, os temas abordados na história são pesados: assédio sexual, exploração, extorsão e prostituição… e assim por diante. A incoerência entre o tratamento dado ao assédio e a exploração das personagens femininas fica para outro texto.

O Metaverso em Persona

O combate é no Metaverso, sempre.
O combate é no Metaverso, sempre.

Como o nome indica, é o além-do-universo que existe “entre a matéria e o sonho”; é um mundo espiritual moldado pela cognição humana. Os desejos humanos distorcidos alteram tanto o Metaverso quanto a vida real. As injustiças causadas pelas distorções cessam apenas por meio de intervenção junto às “sombras”, isto é, as versões cognitivas das pessoas cujos desejos estão corrompidos.

Assim, Joker e seus Phantom Thieves of Hearts (ladrões-fantasmas de coração, em livre tradução) visitam os palácios individuais e Mementos (o palácio coletivo) com o objetivo de confrontar essas pessoas e levá-las ao arrependimento, roubando o tesouro de seu coração e, com isso, ocasionando sua mudança de conduta no mundo real.

Mementos é a dungeon coletiva localizada no metrô de Tóquio.
Mementos é a dungeon coletiva localizada no metrô de Tóquio.

Se você for “cristão praticante”, a essa altura já interpretou que o Metaverso é uma alegoria da corrupção ocasionada pelo pecado, principalmente pela idolatria – concebendo o pecado não como aquilo que você faz, mas como aquilo que você deseja em seu coração. Essa interpretação ocidental é reforçada pela existência de demônios no Metaverso. 

Porém, Persona é um RPG japonês. As aplicações cristãs ficam em segundo plano quando se trata da cosmovisão oriental – basta ver Neon Genesis Evangelion

Principais Mecânicas de Persona 5

Passear por Tóquio com uma confidente e encontrar outro contatinho nunca dá briga.
Passear por Tóquio com uma confidente e encontrar outro contatinho nunca dá briga.

É preciso dar conta de tudo o que é preciso fazer tanto em Tóquio quanto no Metaverso. Portanto, a primeira mecânica importante do jogo é o gerenciamento de tempo: com o desenrolar da história, o jogador precisa visitar os palácios, lutar contra o governante de cada palácio e também visitar regularmente Mementos, espécie de inconsciente coletivo com missões secundárias. Há um prazo fixo para cada palácio e, se for descumprido, é game over.

Joker e sua agenda

São pelo menos três frentes que consumirão seu tempo:

  • Desenvolvimento de habilidades sociais;
  • Desenvolvimento de relacionamentos interpessoais;
  • Exploração dos palácios, inclusive Mementos.

Tanto as habilidades sociais quanto os relacionamentos sociais – os Confidants – são necessários ao combate do jogo. As habilidades sociais permitem craftar itens, negociar com as sombras para capturá-las (ou ganhar itens). Sem as habilidades sociais, o jogador não consegue evoluir o ranking de alguns Confidants – cada ranking com cada amigo e/ou namorada desbloqueia habilidades úteis em combate e exploração. 

Ou seja, tudo o que Joker faz em Tóquio – estudar, sair com amigos, ler no metrô, trabalhar, até mesmo fazer café – só tem um propósito: ser bem-sucedido no Metaverso. As exceções são jogar na loteria em Shibuya, acertar um home run ou visitar 6 vezes o maid café, necessárias apenas para platinar Persona 5 Royal.

A cor do dinheiro

Só a professora Kawakami é mais constrangedora que o maid-café.
Só a professora Kawakami é mais constrangedora que o maid-café.

Palácios são dungeons com inimigos e tesouros. Na exploração de palácios é possível encontrar insumos necessários para craftar itens utilizados em combate e exploração, novas armaduras e armas também. Armaduras são roupas sujas que podem ser lavadas ou vendidas. 

Já as armas são armas de brinquedo que o mundo cognitivo reconhece como aquelas de efeito real. Essas armas podem ser também compradas e personalizadas em uma loja de airsoft. Joker ganha dinheiro com empregos de meio período e também em combate. Dinheiro é importante por aqui porque com ele você compra amigos (presentinhos) e tempo – uma Confidant que lava suas roupas e fabrica itens. 

Nesse sentido, Persona é bem realista: dinheiro é o que move o mundo.

É hora do show!

A sequência de 1-more pode fazer ou quebrar uma luta.
A sequência de 1-more pode fazer ou quebrar uma luta.

Joker entra em combate com 2 ou 3 colegas de equipe, sua party. Cada colega tem seu próprio conjunto de habilidades, normalmente o domínio de um elemento: fogo, eletricidade, vento, gelo, energia nuclear (?!), psicocinese, maldição e benção. Além desses, há ataques melee e tiros. Há também habilidades de cura, ressuscitação, buffs e debuffs (atributos temporários que afetam positiva ou negativamente em combate).

No combate por turnos, quem engaja primeiro – jogador ou inimigo – tem a vantagem do primeiro ataque. Em Persona, é crucial emboscar para atacar primeiro devido ao encadeamento dos ataques. Ao atacar primeiro, cada membro da sua equipe tem sua vez de atacar. Se o inimigo (ou inimigos, como é mais comum) for fraco em relação aos elementais de alguma persona do Joker ou da equipe, ele cai e o jogador tem mais uma possibilidade de ataque – One More. 

É possível escolher entre atacar novamente ou passar a vez – Pass the Baton para outro colega da equipe seguir atacando. Os inimigos também têm direito a One More; só nunca viu a tela de game over em P5R quem nunca errou uma tática e deu ao inimigo uma sequência de ataques.

Passar o bastão é crucial em algumas lutas, como o chefe do Palácio Okumura.
Passar o bastão é crucial em algumas lutas, como o chefe do Palácio Okumura.

Em algumas sequências de combate esse é o único jeito de avançar na luta – por exemplo, quando você precisa derrotar todos os inimigos de uma vez, sem dar chance de recuperação ou de respawn (ressurgirem todos de novo). Esse encadeamento é interessante porque permite, na passagem de bastão, reduzir o custo de magia (SP) a zero. Ocasionalmente, ao passar a vez, você pode desencadear um Showtime: um ataque especial combinado entre dois colegas de equipe.

Se você derrubar todas as sombras, pode negociar com elas – itens, dinheiro e até mesmo capturá-las. São 96 Personas no total e você vai precisar capturar o máximo que conseguir para criar, por meio de fusão, as Personas mais poderosas do jogo.

O salão de veludo (Velvet Room)

É uma Velvet Room bem diferente das anteriores; nela, Joker é prisioneiro.
É uma Velvet Room bem diferente das anteriores; nela, Joker é prisioneiro.

De tudo, a melhor coisa que se pode encontrar no Metaverso são as próprias Personas. Eu, que não gosto de Pokémon, tive que concordar com uma amiga quando ela apontou a semelhança entre os dois jogos. 

Uma vez capturada, a Persona pode ser fundida com outras para gerar uma nova, para fortalecer outra Persona já existente ou transformada em item de combate. Personas que já foram “destruídas” na fusão podem ser chamadas de volta por meio do pagamento de uma taxa. O limite de Personas que se pode carregar no inventário é limitado. 

Recomendo gastar um tempo “fusionando” Personas, além de baixar os DLC gratuitos. Se você fizer as escolhas corretas e o final verdadeiro do jogo, a última batalha e o palácio do terceiro semestre vão requerer Personas muito fortes.

Terceiro semestre em Persona 5 Royal

Yoshizawa é central para o terceiro semestre, assim como Maruki, o conselheiro.
A ginasta Yoshizawa é central para o terceiro semestre, assim como Maruki, o conselheiro.

P5R adiciona alguns personagens à história. Desenvolver relacionamento com esses três é necessário para habilitar o terceiro semestre e o oitavo palácio. Esse terceiro semestre altera o final verdadeiro do Persona 5 original. 

Além disso, P5R traz o palácio do Joker, chamado Thieve’s Den. Na prática, é um hub interativo que funciona como galeria de mídia e traz um joguinho de cartas chamado Tycoon que pode ser jogado com os outros ladrões.

Thieve's Den é o palácio dos Phantom Thieves, adição interessante do Persona 5 Royal.
Thieve’s Den é o palácio dos Phantom Thieves, adição interessante do Persona 5 Royal.

Tenha em mente que P5R é um jogo com muitas mecânicas, mas todas elas apontam para o mesmo fim: combate. Se você tentar jogá-lo como um simulador para encontrar a Waifu perfeita, um simulador de ensino médio ou um simulador de viagem ao Japão, irá se decepcionar. Todos esses elementos estão presentes, mas existem para fortalecer Joker nas batalhas. 

Persona 5 Royal é para mim?

Em resumo, o jogador precisa: gerenciar bem seu tempo – e esse tempo, ao contrário da vida nossa de cada dia, deve ser excepcionalmente produtivo; gerenciar seu estoque de Personas e itens; explorar ao máximo os palácios, “craftar” itens, interagir socialmente, ir bem na escola e ler livros; “fusionar” novas Personas. 

Portanto, se você jogou Persona 5 e gostou, jogue Persona 5 Royal: não é exatamente o mesmo game. O conteúdo adicional muda o final verdadeiro da versão anterior.

O jogo passou por três gerações de consoles, assim como GTA V, e está nas listas dos melhores RPGs de todos os tempos, com a maior nota do gênero no PS4. Se você nunca jogou, dê uma chance. As primeiras 4 horas são de tutorial. Se você vencer essas 4 horas, chegará facilmente em 200h. Ou quase.

Em tempos de pandemia, quando as horas parecem se escoar sem muito sentido ou produtividade, P5R torna-se um jogo extremamente atual, na medida em que nenhum minuto na vida de Joker é jogado fora. Ele é produtivo de um jeito que nós, pandêmicos, não conseguimos ser. 

Cópia de PS4 adquirida pela autora

Revisão: Jason Ming Hong

Persona 5 Royal

9.5

Nota final

9.5/10

Prós

  • Trilha sonora
  • Narrativa
  • Combate
  • Mecânicas de gerenciamento bem implementadas
  • Conteúdos extras

Contras

  • Tutorial longuíssimo
  • Movimentação "tanque"