Astria Ascending é um RPG de turnos que demonstrou um certo potencial para agradar muitos fãs de JRPG. Aspectos como uma rica narrativa, mistura de mecânicas clássicas com modernas e uma arte visual diferenciada foram os motivos para tal. Consequentemente, antes mesmo de seu lançamento, o game desenvolvido pela Artisan Studios causou certo burburinho na comunidade. Honestamente, eu não estava inserido nela, contudo, a curiosidade venceu e quis ver se era tudo isso mesmo.
Desenvolvimento: Artisan Studios
Distribuição: Plug In Digital
Jogadores: 1 (local)
Gênero: RPG
Classificação: 14 anos
Português: Não
Plataformas: PC, PS4, PS5, Switch, Xbox One, Xbox Series X/S
Duração: 30 horas (100%)
Conservadores da harmonia
A mitologia de Astria Ascending é constituída de raças que vivem em harmonia, com cada uma impactando Orcanon de sua forma. Elas possuem seus habitats, características físicas e sociais. Mesmo com diferenças tão notáveis, elas dividem uma semelhança inquestionável: o poder dos astros.
Então, temos a honra de controlar Demi-gods (semideuses, em tradução livre), indivíduos que utilizam de poderes do zodíaco para servir Orcanon e manter a harmonia. Ao concluir seus 3 anos de serviço, as lendas dizem que eles partem para o céu para brincar com as estrelas. Aqui, tomamos o controle da 333º linhagem de Demi-gods em seus meses finais de serviço.
Ulan é a líder dessa legião e, com ela, controlamos um total de 8 indivíduos que são reconhecidos como guerreiros da harmonia, com alguns sendo de raças ou reinos distintos. Essa quantidade é questionável, já que Astria Ascending falha em desenvolvê-los de forma profunda. Mas não por falta de conteúdo e ideias, visto que elas estão ali, como a ética e visão de mundo de cada raça. Porém, em grande parte, permanecem contidas, como se fossem um pano de fundo apenas para o princípio do enredo.
Nos 45 minutos do segundo tempo, criaturas chamadas Noises adentram Orcanon misteriosamente e ameaça a harmonia entre as raças, obrigando a legião de Ulan a investigar esse mistério ao redor dos reinos. No decorrer desta aventura, é visível que a relação dos 8 semideuses é cheia de intrigas e problemas, ainda que estejam juntos há mais de 2 anos. Aliás, em nenhum momento o fato de que irão sumir para sempre em pouco tempo é discutido. Por consequência, a narrativa é frustrante por ter potencial em se tornar densa e ramificada, mas não arrisca um aprofundamento.
Sinceramente, o que mais me prende em JRPGs é todo o universo criado e sua mitologia. Acredito estar sendo exigente, pois os fatores mitológicos presentes e as questões citadas conseguem sim agradar. Por se tratar de uma desenvolvedora razoavelmente nova, é compreensível o receio em introduzir mais do que conseguem lidar com. Porém, Astria Ascending tem a faca e o queijo na mão para criar algo épico, e fico tudo ali mofando. Visto isso, permaneci até o final com um gosto azedo na boca, pois “esse queijo acabou estragando”.
Um combate para deuses
Como já foi dito, a 333ª legião de semideuses são os grandes protagonistas dessa aventura, o que nas batalhas dá um total de 8 personagens. É inquestionável que a quantidade é grande, mas só utilizamos 4 deles em combate, enquanto os outros podem ser alterados no desenrolar da luta.
Independente da quantidade, a dificuldade não é baixa, e exige certo cuidado com a escolha do quarteto principal. Isso deve ser levado em conta, pois a ordem dos turnos depende da velocidade dos personagens. Então, caso um chefe seja mais rápido que todo o seu quarteto inteiro, a cada turno seu, o chefe irá atacar uma vez.
Por exemplo: você tem um mago, um feiticeiro, um invocador e um curador. O primeiro a atacar seria o chefe, depois o mago, novamente o inimigo, e assim por diante. Claramente, isso não é nada efetivo. Porém, são normalmente esses jobs ou classes que são mais recompensados em batalha.
Astria Ascending recompensa demasiadamente a exploração de fraquezas, normalmente ligadas a elementos como fogo, água ou vento. Dependendo do quão efetivo um elemento é contra um inimigo, pontos de foco são recebidos ou perdidos. Eles permitem ampliar a porcentagem de dano causado, em que 4 pontos são o máximo disponível por personagem.
Porém, assim como os semideuses, os Noises também possuem essa mecânica. O que modifica a dificuldade das batalhas é o quão bem os inimigos utilizam esses pontos. De início, quase nenhum usufrui disso, mas, para equilibrar, os seus ataques são bem desbalanceados. Um exemplo absurdo é o segundo chefe, que possui uma magia que dá dano em todo mundo, pode matar instantaneamente e, se sobreviver, ainda aplica confusão ao alvo.
Trabalho de semideus
Guerreiro, soldado, mago, feiticeiro, ladrão, assassino, enfim, as classes mais comuns nos RPGs de turno, ou melhor, os afamados jobs, estão presentes aqui. Astria Ascending simplifica a forma como um simples personagem deriva-se em outras 4. Isso mesmo, cada um dos semideuses possui 4 classes que se unem, liberando novas habilidades e possibilidades de equipamentos. Ainda com pouca inovação de classes, essa união cria diversificados estilos de magia.
Outro complemento para que os semideuses se aproximem do seu poder absoluto são as árvores de habilidades, baseadas em constelações ou signos do zodíaco. Cada uma delas não apresenta muitas mudanças, em sua maioria, são apenas habilidades passivas e aumento de status. Evoluir qualquer coisa não adianta em nada e pode dificultar ainda mais o combate. A dica aqui é priorizar upgrades que se assemelham com o conjunto de jobs do semideus.
Novamente, a escolha de se controlar 8 personagens é desgastante. A quantidade de informações e detalhes que influenciam fortemente as batalhas devem ser avaliadas e bem escolhidas. Experiência própria: iniciei um novo jogo pouco me importando com isso, e me vi perdendo aliados muito rapidamente, tendo que usar poções de ressurreição o tempo todo. Então, na segunda tentativa, fiquei uns bons minutos avaliando o que escolheria para cada personagem.
Por fim, se você é daqueles que ama entrar no universo de The Witcher 3 apenas para jogar Gwent, então talvez J-Ster te conquiste. Na realidade, a melhor comparação seria com o Tetra Master de Final Fantasy IX, pois possuem regras e objetivos semelhantes. Nesse jogo, utilizamos fichas de monstros para dominar o inimigo. Aquele que terminar a partida com o maior número de conquistas no tabuleiro ganha o jogo e também as cartas do adversário – simples assim. Há diversas fichas para serem conquistadas por Orcanon e quase todos os NPCs podem ser desafiados.
Orcanon e suas confusões
De forma resumida, é na questão artística que Astria Ascending realmente cresce. Arcanon é totalmente vista de forma bidimensional com o tradicional side-scrolling, ainda assim, não deixa de impressionar por sua beleza. Tanto os personagens quanto os cenários são contemplativos, e, caso seja um fã de animes duvidosos, terá muito mais para apreciar. Não é algo muito ruim, mas a movimentação dos seres, principalmente dos humanos, é muito robótica e causa estranheza. Já a física funciona bem até demais, em que partes do corpo se movimentam como se fossem extremamente reais – especialmente do feminino.
As dungeons são o fator divertimento em muitos RPGs, nas quais procuramos por baús, enfrentamos inimigos e completamos quests. Astria Ascending tem tudo isso, mas ele adiciona um mapa e alguns puzzles para tornar tudo mais interessante. Funciona? Infelizmente, não. Os puzzles são baseados em procurar e achar locais na ordem correta, e muitos deles são simples e rápidos de se encontrar.
Agora, com relação ao mapa, nem o cartógrafo de Hollow Knight o salvaria. Um aspecto divertido nas masmorras presentes aqui é o leva e traz de itens. Porém, para que isso funcione de forma agradável, saber de onde veio e para onde vai é preciso, e nem isso o mapa mostra direito. Os níveis da masmorra são interligados por linhas que mostram por onde passamos, contudo, voltar em uma porta, às vezes, pode levar a novos níveis. Isso leva a duas possibilidades: ou eu sou péssimo lendo mapas, ou Astria Ascending precisa de um cartógrafo urgente. Em minha defesa, digo que nunca “bombei” em geografia.
Tentativa e erro
Astria Ascending é um JRPG que tenta unificar elementos tradicionais do subgênero de diferentes formas. Às vezes, acerta, mas ainda desliza e compromete a experiência, sendo a narrativa e a exploração bons exemplos disso. Já em outros tópicos, a porcentagem de erro é altíssima, mas ele consegue agradar ainda que pouco, como por exemplo, a junção de classes e suas customizações. Porém, ainda que tenha algumas coisas bizarras, é no visual que Astria Ascending ascende. A visão que fica é a de confusão entre um conglomerado de acertos e erros importantes, mas também nocivos para a experiência.
Cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Jason Ming Hong