Nada se cria, tudo se copia: o quanto isso necessariamente é um problema? Zelda Breath of the Wild é um jogo lançado em 2017 e criou tendência entre títulos de mundo aberto com temática de fantasia, seja influenciando através mecânicas ou enredo. Oceanhorn 2 possui claras inspirações na franquia da Nintendo desde seu antecessor, mas a diferença é que o segundo título da série se baseia bastante em BotW no quesito exploração, ambientação e combates de forma geral, enquanto que o primeiro era uma tentativa de se parecer bastante com a fórmula clássica da franquia. Isso não é um problema, em minha opinião, até porque ninguém tenta imitar algo sem qualidade – o que certamente The Legend of Zelda tem.
Por vários anos, Oceanhorn 2 foi pra mim um sonho de consumo. Eu queria muito ter a experiência do jogo, o que era impossível devido à sua exclusividade desde o lançamento para plataformas Apple. Finalmente, a Cornfox & Bros trouxe Oceanhorn 2 ao Nintendo Switch e foi impossível não me animar ao máximo quando soube. O quanto uma espera vale a pena?
Desenvolvimento: Cornfox & Bros.
Distribuição: Cornfox & Bros.
Jogadores: 1 (local)
Gênero: RPG, Aventura, Ação
Classificação: 10 anos
Português: Legendas e interface
Plataformas: iOS e Switch
Duração: 12.5 horas (campanha)/23 horas (100%)
Um mundo belíssimo
A sequência intitulada Oceanhorn 2, apesar de parecer uma continuação, é na verdade uma prequela do primeiro. Sua história aborda eventos de 1000 anos antes de Oceanhorn: Monster of Uncharted Seas e seu protagonista é chamado de “O Herói”. O protagonista, através das mãos do demônio Mesmeroth, é dado como um bebê aos cuidados de Mestre Mayfair. Anos depois, já crescido, Herói chega em uma ilha com o objetivo de concluir o seu treinamento para virar um verdadeiro cavaleiro. Após o sucesso em sua missão, o personagem retorna ao seu mestre e, repentinamente, uma nave cai próximo dali.
Ao chegar no local do impacto acompanhado de seu amigo robô Gen, conhecemos Trin, filha de uma famosa figura chamada Arquimedes, que depois revela-se um amigo de Mayfair. A moça nos diz que descobriu os planos de Mesmeroth em tomar o reino para si, e que está sendo perseguido devido seu conhecimento. Então, nosso Herói, seu amigo robótico Gen e a recém-chegada Trin partem para a capital em busca de ajuda. Mais à frente, a principal missão é recuperar os Emblemas de Criação que impedirão os planos malignos de Mesmeroth – diria que é um pouco engraçado o próprio vilão do jogo entregar às mãos de Mayfair aquele que traria sua ruína no futuro. Em resumo, toda essa história é contada através dos diálogos entre personagens, dublagem em inglês de uma qualidade “ok” e raras cutscenes feitas com a própria engine do jogo – a propósito, Unreal 4. O port para Nintendo Switch é bem decente, a resolução é incrível e as texturas são muito acima do esperado, porém é meio decepcionante termos apenas 30 fps de performance, enquanto que nos dispositivos iOS o jogo chega em até 60.
Oceanhorn 2 certamente me cativou pela sua beleza feita à mão logo de cara, tanto que fiquei durante vários dias publicando capturas de tela que eu fazia enquanto jogava. Se anteriormente eu “babava” vendo apenas sua jogabilidade em vídeos na internet, com ele executando ali em minha frente com certeza a experiência é outra. É um produto que esbanja beleza e não economiza em tirar o fôlego com seus cenários. Os ambientes são bem construídos, o level design é incrivelmente bem feito e inspira a exploração do jogador, os gráficos são de cair o queixo e fazem até mesmo a gente acreditar que se trata de um jogo magnífico criado por uma empresa veterana do ramo. Bom, se eu pudesse resumir Oceanhorn 2 em uma só palavra, seria “grandioso”. Infelizmente, as coisas param por aí, o que faz com que a sequência deixe à mostra suas várias falhas. E nem digo isso se tratando de um clone de The Legend of Zelda, porque Oceanhorn 2 tem seus méritos, mas como jogo em si mesmo ele não é tão grandioso quanto tenta parecer.
O primeiro Oceanhorn era incrível, mesmo que muitos o considerem uma cópia barata dos jogos isométricos da série Zelda. Sua estreia modesta foi nos dispositivos móveis, nos sistemas iOS e, posteriormente, Android. Anos depois, Oceanhorn fazia sua aparição nos consoles de última geração com várias melhorias gráficas possibilitadas pela tecnologia provida por estas máquinas. De qualquer forma, é um jogo ainda muito bom nos dias de hoje e de qualidade bem acima do esperado, ao mesmo tempo que soube encontrar seu lugar ao sol no cenário independente de games.
A Cornfox & Bros. soube executar muito bem sua proposta de exploração, combate leve e puzzle existentes em suas várias dungeons. Apesar de ser um jogo simplista, é extremamente divertido e muito bem resolvido. Infelizmente, Oceanhorn 2 parece ter investido demais em gráficos e acabou não entendendo qual caminho queria seguir. A sequência é uma mistura de RPG, mundo aberto e uma inserção de vários elementos que não agregam tanto à aventura de verdade.
Um mundo grande sem propósito
Nosso herói sem nome viaja por vários locais que não recompensam o jogador ao explorar, já que o máximo possível de encontrar são munições para suas armas de longo alcance, moedas para comprar itens em máquinas extremamente superfaturadas em seus preços exigidos e um mundo com vários NPCs que não somam em nada com suas falas. Falando em conversas, as atuações e linhas de diálogo dos personagens que acompanham o protagonista muitas vezes são forçadas e desnecessárias, ficando bem na cara a tentativa de criar empatia para com esses personagens através de falas supostamente carismáticas ou necessárias para o enredo.
Existem momentos também de navegação de um local para outro, porém com um mundo semi-aberto que não permite “estacionar” a embarcação ou avião em qualquer ilha para explorar. Não existe qualquer senso real de aventura, já que tudo não passa de um quadro belo com a utilidade única e exclusiva de apreciação. Mesmo em ambientes abertos não existe recompensa plausível ao andar a esmo, e no máximo seremos recompensados com algum dinheiro ou com inimigos que pulam em você para brigar. Abrindo o mapa, é possível notar a posição de todos os baús na respectiva região, porém a recompensa por abrirmos estes objetos nada mais é do que supostos colecionáveis que se transformam arbitrariamente em dinheiro – talvez uma solução fácil para evitar a criação de um sistema de venda de itens.
Side-quests existem sim graças à inclusão de todo o conteúdo da Golden Edition que veio da versão de iOS, com o propósito de dar longevidade ao jogo uma vez terminada a história que dura entre 8 e 13 horas – caso você seja um grande explorador. Mesmo assim, faça um leve exercício consigo mesmo e me responda: o que de tão recompensador essas missões secundárias podem oferecer já que não existem skins para personagens ou algo desbloqueável e interessante o suficiente que não seja encontrado pelos gramados ao redor do mundo de Oceanhorn 2? Espero ter ajudado.
Batalhas sem sal
Itens equipáveis (são pouquíssimos) e outros objetos são encontrados em baús estrategicamente posicionados, e são elementos chave para progredir. Porém, muitas soluções e usos são bem improvisados e sem nexo, como a exigência de encontrar um escudo para que o herói possa empurrar grandes e pesadas pedras com seu cotovelo. Bom, fica a questão como um cotovelo tem mais força do que duas mãos empurrando uma rocha de tamanho exagerado. Ou então uma garra que pode ser usada para enganchar-se em locais com um suporte para ela, ao mesmo tempo que é possível de utilizá-la como arma para ir até inimigos num piscar de olhos – mesmo os inimigos bem menores do que o protagonista, o que é curioso.
As batalhas são completamente engessadas e sem graça, além de não existir uma forma de travar a mira no oponente e nenhum botão ser possível de remapear. Os golpes são lentos, o momento de aparar o ataque inimigo parece bem aleatório, a barra de fôlego é ridiculamente curta e o golpe mais forte do personagem exige alguns segundos pressionando o botão de ataque enquanto você fica completamente exposto – acho que usei cerca de 3 vezes no jogo inteiro devido à sua inutilidade. Armas de longo alcance são verdadeiramente úteis apenas se o tiro for dado na cabeça do inimigo, o que causa um dano significativo. A barra de experiência não diz qual a recompensa ao subir de nível, o que causa um total desinteresse em batalhar por progressão de atributos – considerando que as batalhas são bem dispensáveis.
Durante esses confrontos, seus ajudantes muitas vezes ficam só rondando o inimigo e causando irritação por causa da inteligência artificial completamente falha. Quando finalmente estes personagens resolvem ajudar, o dano causado não é lá essas coisas, sendo muito mais ágil resolver o problema você mesmo. Confesso que era uma excelente ideia, mas a programação não ajudou em nada.
Calma lá, existem pontos bons
Possivelmente o ponto mais divertido do jogo seja a Arma de Feitiços, que vai recebendo novos elementos ao longo da jornada, como raio, fogo e gelo. Além destes feitiços serem possíveis de causar dano aos inimigos, também são usados para resolver vários puzzles nas dungeons, cujos momentos também são de longe os mais divertidos em Oceanhorn 2 por exigir um raciocínio maior por parte do jogador. Eu diria que, se Oceanhorn 2 não tivesse estes quebra-cabeças, tudo estaria fadado ao fracasso de uma forma mais profunda.
Muitas vezes também é possível enviar comandos aos NPCs que te acompanham, como ativar alavancas, pisar em botões que abrem portas, e tudo isso é feito enquanto podemos realizar ações simultaneamente para resolver os enigmas. As lutas com chefes seguem a mesma linha, e felizmente não focam em apenas uma batalha de confronto direto, esquiva e defesa. É necessário pensar um pouco “fora da caixa”, e até mesmo utilizar o cenário ao seu favor para conseguir a vitória. Ponto extremamente positivo, já que consegue misturar várias mecânicas nestes momentos e exigir do jogador o máximo de sua habilidade. Mesmo assim, Oceanhorn 2 não é necessariamente difícil, mas possui desafio na medida certa e é bastante generoso com a quantidade de itens encontradas em gramados e barris.
Mirou alto, acertou no médio
Oceanhorn 2 tenta parecer algo bem maior e polido do que realmente é – e à primeira vista pode até convencer. O jogo possui problemas de queda de ritmo absurda, batalhas extremamente maçantes, sistema de compra de itens praticamente inúteis e mundos caprichados com um péssimo aproveitamento. Infelizmente minha espera durante todos esses anos não valeu a pena e continuo achando o antecessor bem melhor do que a sequência por ser mais focado e bem acabado.
Oceanhorn 2 mirou em Zelda, acertou na implementação de puzzles e pecou em todo o resto. Fico triste em dizer que sua presença não é nada marcante, e receio que continuará sendo lembrado apenas como “um clone de Breath of the Wild” misturado com Wind Waker e sua trupe.
Esta review foi feita com uma cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Bia Bock