Quem me conhece sabe o quanto tenho receio de jogos da falecida TellTale Games. Porém, um grupo de ex-funcionários da empresa parece saber entender muito bem como fazer jogos de aventura com aspectos modernos. A Skunkape Games decidiu reviver Sam & Max Save The World, originalmente vindo em 2006 pelas mãos da TellTale num terrível formato episódico, trazendo a dupla policial antropomórfica mais engraçada do mundo dos games – presente também nos desenhos animados – ao PC e Nintendo Switch. Lançado em dezembro de 2020, Sam & Max Save The World Remastered contém todos os seis episódios do jogo original, além de gráficos completamente retrabalhados e formato widescreen.
Desenvolvimento: Skunkape Games
Distribuição: Skunkape Games
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Aventura
Classificação: 12 anos
Português: Não
Plataforma: PC e Switch
Duração: 12.5 horas (campanha)
Uma excelente coleção
Sendo basicamente uma coletânea com todo o conteúdo lançado há mais de uma década, Sam & Max Save the World Remastered reúne seis histórias que se interligam entre os episódios, com elementos que surgem novamente entre um conto e outro, dando um excelente senso de continuidade. Sam é o cão, o mais “sério” da dupla e age como o líder; e Max é um coelho baixinho completamente excêntrico – meu preferido -, que solta frases engraçadas e cria situações absurdas na maioria das vezes, porém, é um tipo de personagem que não agrada a todos.
Na linha seletora de episódios é possível iniciar a partir de qualquer um, sem necessidade de experienciar missão por missão para prosseguir. Isso é muito bom, pois permite maior liberdade ao jogador, mas é bom ter em mente que algumas coisas não farão sentido mais tarde – assim como as várias mudanças de profissão de Sybil -, já que fazem parte do episódio anterior.
No primeiro episódio a tarefa da dupla de policiais free-lancers é desvendar um estranho ocorrido, em que algumas pessoas estão agindo de maneira fora do comum e aparentam estar hipnotizadas, além de que pequenos rapazes estrelas de um programa de TV, os Soda Poppers, estão agindo estranhamente e promovendo um programa em videocassete bastante esquisito. O carro, DeSoto, é o maior parceiro de ambos, e os levará para cenários que vão desde um local da cidade até mesmo a Lua, como no episódio seis, em que os protagonistas vão até o satélite natural da Terra para salvar o mundo de uma dominação hipnótica a nível global.
No episódio dois, Sam e Max precisam descobrir o que deixou uma apresentadora de um talk Show, Myra Stump, completamente furiosa; no terceiro, precisamos nos infiltrar numa operação subterrânea de uma máfia de brinquedos existente num Casino; no quarto episódio, foi decretado federalmente um abraço grupal; enquanto que no quinto, um videogame de realidade virtual está mantendo pessoas reféns da tecnologia. A cada episódio sucedido, alguns personagens retornam aqui e ali, menções relacionadas a eventos anteriores são feitas e, normalmente, Sybil troca de profissão e muda as placas de seu estabelecimento. Por isso, para não perder as piadas e a empatia para com os NPCs, é necessário seguir a ordem dos episódios.
Primor do point ‘n’ click
Jogos no passado, como os incríveis Monkey Island e The Dig da LucasArts, eram obras excelentes do mundo dos games de adventure, porém, demandavam uma exploração a nível absurdo, já que não haviam dicas, pistas tão claras e muitos menos um recurso visual demonstrando com o quê no cenário era possível de interagir. Sam & Max Save The World Remastered resolve este problema com um recurso muito interessante segurando o L (no Switch), o que mostra todos os pontos do cenário que são passíveis de interação, além de poder navegar entre eles utilizando o analógico direito e saber o “nome” de cada.
Isso facilita bastante a experiência e tira a necessidade chata de tentar clicar em tudo. Porém, uma forma de manter o recurso ativado seria muito bem-vinda, em vez de precisar segurar o botão toda vez. Também fica mais agradável o fato de que o jogo suporta toques na tela na versão de Switch – obviamente, apenas no modo portátil. Porém, não pense que isso vai resolver sua vida, tão pouco evitará o processo de utilizar itens do inventário com o cenário, mas somente auxiliará nas missões. Apesar de ser um facilitador para esse tipo de jogo, a própria lógica de Sam & Max Save The World Remastered não é algo tão óbvio, e tenho certeza de que isso será difícil para muitos.
Muitas das soluções por aqui são coisas que normalmente vemos em desenhos animados, como por exemplo um enigma que resolvemos atirando com a pistola de Sam em um monte de queijos que Max estocou no armário do escritório, pois precisávamos entregar queijo suíço – aquele cheio de buracos – para nosso ratinho inquilino.
Outra situação é o dinheiro que a dupla precisava para adquirir um item, e a solução era a mais absurda possível: dirigir o carro na rua, atirar na lanterna traseira de um motorista qualquer e depois pará-lo acusando de estar conduzindo um veículo com partes essenciais quebradas. Garanto que o desfecho disso não faz a menor lógica e não é nem um pouco óbvio para a maioria das pessoas – e nem para mim.
Estes enigmas que citei acima não foram resolvidos apenas com base em minha intuição ou investigação, mas muitas vezes tive que procurar na internet as soluções. Portanto, acredito que uma espécie de sistema de dicas ou pelo menos uma recapitulação do que houve até então no episódio seria de grande ajuda, como um histórico.
Domínio do inglês é necessário
Num jogo de adventure como Sam & Max, não apreciar os diálogos e interações entre os personagens é uma perda de basicamente 90% do conteúdo. Mesmo com um conhecimento alto do inglês, alguns adjetivos e piadinhas acabaram passando batidos ou compreendidos apenas através do contexto. Uma localização em Pt-Br cairia muito bem, com certeza, mas pode apostar que a maior parte dos trocadilhos e do bom humor nativo do inglês não funcionaria ou ficaria adaptado de forma anormal. Portanto, para jogar Sam & Max Save the World Remastered é recomendado um nível de inglês avançado.
Já se tratando dos personagens, Max é um personagem bastante “aparecido” e fora do comum, e isso pode não agradar a todos. Suas piadas vão desde trocadilhos do inglês até frases com uma mistura de ironia e sarcasmo, muitas vezes fazendo simplesmente o estilo “pastelão” de humor que nós, brasileiros, costumamos ver em obras como Chaves. Mas Sam também não fica de fora dessa, seus diálogos são um pouco mais sérios em relação ao parceiro, mas mesmo assim é possível ter sorrisos arrancados em várias situações.
A melhor parte dos diálogos, na minha opinião, é ver variações de uma mesma opção de fala. Um exemplo é no episódio do Casino, em que os protagonistas não sabem a senha para entrar em um dado local, e a cada tentativa que fazemos com a frase uma nova linha de diálogo é apresentada. Obviamente, as mudanças não são infinitas, e uma hora as variações se repetem ou simplesmente encerram.
Um remaster de peso
Normalmente os produtos remasterizados me deixam com um pé atrás, simbolizando algo para mim com o mínimo esforço possível. Porém, Sam & Max Save the World Remastered possui vários pontos positivos, e o maior deles é trazer os seis episódios num pacote só. As músicas e dublagens podem até ser – quase todas – as mesmas do jogo original, além de algumas piadas até terem sido removidas (como a da troca de sexo de Bosco), mas o trabalho de luz e sombra, modelagem 3D dos personagens e a qualidade visual, mesmo num console como o Switch, é de encher os olhos. Por isso, recomendo a coleção sem medo, e mesmo eu não sendo um fã da TellTale depois de um certo período em que seus jogos começaram a ser tratados basicamente como re-skins, eu diria que a Skunkape Games soube exatamente o que faz um adventure brilhar.
Cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Kiefer Kawakami
Sam & Max Save the World Remastered
Prós
- Visuais belíssimos
- Excelente bom humor
- Personagens muito carismáticos
- Histórias cativantes
- Muito conteúdo
Contras
- Soluções insanamente “fora da caixa”
