Visage é um jogo extremamente pesado, com temas altamente adultos e gráficos de cair o queixo. Com fortes inspirações no playable teaser do falecido Silent Hills – que ficou mais conhecido pela sigla P.T. -, Visage foi iniciado em 2016 através do Kickstarter por fãs da obra que Hideo Kojima viria a lançar juntamente a Guillermo Del Toro alguns anos atrás, pelos braços da Konami. Com a saída de Kojima da empresa japonesa, Silent Hills ficou pra história e vivo nas lembranças dos amantes de jogos de terror psicológico. Porém, isso foi o suficiente para que títulos similares começassem a ser feitos com base em Silent Hills.
Como um grande aficionado por games com temáticas de horror desde os primórdios de minha vida como gamer, confesso que fiquei empolgado na época com a divulgação de um possível retorno da franquia Silent Hill em outra perspectiva, ao mesmo tempo que considero o terror baseado em jumpscare um dos mais baixos existentes. Fica a dúvida: Visage é realmente um terror psicológico como afirma ou mais um produto que faz uso de sustos para colocar medo no jogador?
Desenvolvimento: SadSquare Studio
Distribuição: SadSquare Studio
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Terror, Aventura
Classificação: 14 anos
Português: Interface e Legendas
Plataformas: PC, Xbox One e PS4
Duração: 4.5 horas (campanha)/14 horas (100%)
Uma casa maligna
O enredo tem início em uma casa terrivelmente escura, num cenário noturno e completamente favorável para criar a ambientação aterrorizante e dar calafrios na espinha do jogador. Temos o controle em nossas mãos após a cutscene inicial, a qual apresenta um homem atirando em sua família em sequência e acaba se suicidando após eliminar todos ao seu redor no quarto. São cenas pesadas e de violência exposta, sem o medo de mostrar sangue e frieza através de gráficos bem acima da média – levando em consideração que se trata de um produto independente.
Visage possui uma jogabilidade muito focada em exploração, interação com o cenário e objetos espalhados por aí. É possível abrir gavetas, portas e adentrar os cômodos da enorme casa e ter a sensação constante de que algo estará ali para te pegar quando você menos espera. E provavelmente estará mesmo. Existem momentos do tipo, dignos de cenas que provavelmente fazem parte de algum pesadelo que você já teve em algum momento da vida. São vultos passando, pessoas sem rosto surgindo no meio do nada e caminhando para um cenário sem luz, ruídos que incomodam a audição do jogador e vários outros elementos que mexem com o psicológico, mas grande parte destes ocorridos são dependentes da mecânica de sanidade.
O objetivo em si não é complicado ou demanda muita estratégia, mas normalmente diz o que precisa ser feito em uma checklist no menu principal sem qualquer espécie de guia ou mapa para se orientar. Aliás, não recomendo fazer a consulta da próxima tarefa em qualquer lugar, uma vez que não existe uma função de pausa de verdade em Visage. Nem mesmo navegar entre os menus de opções faz com que a jogabilidade congele, então fica o aviso: não existem intervalos.
Mantenha-se são, então ficará a salvo
Visage realmente sabe amedrontar até mesmo os mais corajosos, ainda mais implementando o já mencionado sistema de sanidade. Ele te obriga a evitar ambientes escuros, já que sua estadia em locais assim acaba derrubando rapidamente o nível de sanidade e eventos paranormais começam a surgir, até que finalmente surge um ser das sombras e mata o personagem sufocado. Existem algumas formas de se manter são, como fazer uso de comprimidos que eleva novamente os níveis e servem como um quebra-galho para os momentos críticos, porém a principal forma será mesmo por meio de fontes de luz – por menor que seja.
Mesmo assim, acender um isqueiro – este não auxilia na sanidade – ou colocar fogo no pavio de uma vela possuem efeitos temporários de luminosidade, já que o gás do isqueiro se apaga e a vela é soprada com a movimentação. Há também um inventário onde podemos guardar objetos para carregar conosco, como as próprias velas, itens chave e lâmpadas para serem trocadas, já que em certos cômodos a lâmpada simplesmente queima ou até mesmo o interruptor deixa de funcionar. Em um certo capítulo, é possível encontrar uma câmera fotográfica que emite um flash ao ser usada, e isso é muito assustador porque a qualquer momento você tem o sentimento de que a luz vai revelar algo terrível à frente.
Quase 100% terror
À primeira vista, fiquei apaixonado pelo trailer de Visage, por demonstrar que existe um grande fator psicológico em sua jogabilidade. Na real, trata-se de meias-verdades. Muitos games do gênero horror vem fazendo o uso excessivo de jumpscares em vez de investir na fórmula de terror psicológico, e Visage felizmente até faz o contrário diversas vezes. Quando surgiu um vulto parado em um local onde não havia ninguém, realmente meu psicológico ficou abalado. O mesmo aconteceu quando objetos que estavam ali simplesmente desapareceram e surgiram em outro local.
Muitos elementos sobrenaturais e quartos escuros em que eu precisava entrar sem qualquer tipo de defesa me deixaram com uma alta sensação de desconforto, principalmente na primeira hora de jogo. Meu coração disparava facilmente e um nó na garganta era o que eu mais sentia em todo e qualquer cômodo. Era um medo constante de acender a luz e existir algo ou alguém ali me observando.
Pois é, Visage resolveu investir em alguns sustos… e isso é bem triste. Meu primeiro susto não me deixou com medo, mas sim com raiva. Com raiva porque, quando jogo algo do gênero terror, eu não quero ficar recebendo impactos repentinos de emoção, mas sim ter o mesmo sentimento que surge quando preciso entrar em cômodos que lembram pesadelos. Esse tipo de técnica é muito baixa e ao mesmo tempo covarde, porque faz o uso de som estridente para causar a falsa sensação de apreensão.
Muitas vezes isso é até mesmo bem previsível, e eu sabia que isso estava para acontecer. Em um certo momento, quando olhei no espelho e vi que havia alguém atrás de mim, olhei para trás enquanto a pessoa simplesmente desaparecia na escuridão. Voltando a visão para frente, esse mesmo vulto pulou na frente do espelho resultando em um momento de muita raiva e decepção.
Em uma outra situação, o espírito da garota Lucy (um dos “inimigos” do jogo) pulou para trás em meio à escuridão, e isso foi completamente assustador. Porém, o som estridente também ocorreu junto ao movimento, e isso é incômodo. Existe mais algumas poucas vezes que Visage resolve apelar para jumpscares, mas em geral é um produto bastante competente se tratando de terror psicológico e no quesito “dar medo” de forma plena e profunda.
Pontos baixos
Como dito, Visage é ótimo. Mas algumas coisas simplesmente tiram a imersão do jogo ou passam a sensação de raiva. O personagem não possui membros, e é comum vê-lo movimentando objetos ou girando certas coisas com “a força do pensamento” – obviamente uma ironia. Resident Evil 7 é um excelente exemplo de como criar uma jogabilidade em primeira pessoa, mas ao mesmo tempo mostrar que existem pés, mãos e um tronco ali caso você olha para baixo, tirando a sensação terrível de que estamos controlando apenas uma câmera que gira e interage com o cenário.
Já em termos de gameplay, Visage é muito confuso com o manuseamento dos objetos. Em todo tempo eu me confundia com qual comando largava um item no chão, ou então fazia uso dele, e até mesmo como trocava ambos de mão. Provavelmente a versão para PC do jogo deve ter uma distribuição melhor entre as teclas e mouse, mas a de console fica devendo por não ser nada intuitiva.
Por fim, Visage não parece ter uma regra tão clara sobre como a luz tem influência sobre a sanidade do personagem. Diversas vezes fiquei parado em locais bastante iluminados, mas a assombração simplesmente vinha e acabava com minha vida. Para piorar, os loading são bem demorados, o que torna o processo de morte e restauração do save um verdadeiro parto.
Muito melhor do que o esperado
Nunca joguei o playable teaser de Silent Hills, até porque não tenho um console da Sony. Mesmo assim, é possível notar o quão capazes são os desenvolvedores de Visage, já que o game consegue passar a sensação perfeita de medo do desconhecido e do escuro que, juntas, fazem dele um dos melhores títulos de terror que já joguei até hoje. Existe muito conteúdo disponível, e são 4 capítulos ao todo que serão capazes de lhe entreter – e principalmente amedrontar – por várias horas.
Além da jogabilidade em si, Visage também brilha através de sua história, contando os eventos de dramas familiares e situações que se passaram na casa do jogo em tempos passados. Realmente, não é algo indicado para ser jogador à noite, e muito menos com fones de ouvido. E isso é excelente. Curiosidade: demorei muito para continuar jogando Visage, porque levei um tempo para tomar coragem. Mesmo fazendo isso em plena luz do dia e com minha esposa ao lado, o sentimento era de apreensão constante.
Cópia de Xbox One cedida pelos produtores
Revisão: Kiefer Kawakami