Quando Gods & Monsters foi anunciado na E3 de 2019, o level design e mecânicas apresentadas na demonstração levaram muitas pessoas a associarem o novo projeto da Ubisoft ao aclamado The Legend of Zelda: Breath of the Wild, da Nintendo. Rebatizado de Immortals Fenyx Rising, o jogo finalmente chegou no dia 3 de dezembro para PC, PS4, PS5, Switch, Xbox One e Xbox Series X/S. Acredito que a grande questão é se o game possui identidade o suficiente para se afastar da obra que o inspirou ou se é apenas um “Zelda da Ubisoft”.
Desenvolvimento: Ubisoft Quebec
Distribuição: Ubisoft
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Ação e Aventura
Classificação indicativa: 12 anos
Português: Dublagem, legendas e interface
Plataformas: PC, PS4, PS5, Switch, Xbox One e Xbox Series X/S
Duração: 23 horas (campanha)/55.5 horas (100%)
Salve os deuses e deusas do Olimpo
Um dos temas mais populares e difundidos em mídias de diferentes formatos são as fábulas envolvendo os deuses e deusas do Olimpo. Me arrisco a dizer ser um dos temas da História que atrai maior interesse das pessoas. A Ubisoft Quebec conseguiu transportar a riqueza dessas lendas e concentrá-las num roteiro que, apesar de não ser original e um tanto quanto previsível, diverte e nos prende do início ao fim. A história é narrada sob a perspectiva do titã Prometeu (com hilários comentários de Zeus), que na mitologia grega criou os homens, concedeu a eles o domínio do fogo (para os diferenciá-los dos outros animais) e por isso foi aprisionado.
O monstro gigante Tifão, na mitologia, é filho de Gaia e Tártaro. Segundo as fábulas, o gigante é pai de monstros como Hidra e Cérbero. Tifão busca vingar sua mãe da derrota que sofreu pelos deuses do Olimpo. A história do game segue, mais ou menos, a premissa estabelecida nessas lendas, em que Tifão busca destronar os seres imortais. Na sua escalada rumo ao Olimpo, o monstro consegue roubar a essência dos deuses e guardá-las no Tártaro. No processo, o mundo começa a colapsar, espectros tomam conta da Ilha Dourada e os seres humanos são transformados em pedra.
Com os deuses enfraquecidos, a esperança passa a ser depositada nas mãos de Fenyx, um náufrago que misteriosamente não padeceu da mesma maldição acometida às outras pessoas. Com a ajuda de Hermes, Fenyx precisa resgatar a essência dos deuses do Olimpo, espalhadas pelos quatro cantos da Ilha Dourada, para unir forças e, com isso, acabar de vez com os planos de Tifão. Seguindo uma tendência já estabelecida em jogos mais recentes da Ubisoft, podemos escolher o gênero de nosso personagem. Além disso, possuímos outras opções de customização interessantes para “montarmos” nosso personagem da forma como melhor entendermos: cor de pele, cabelo, pelos faciais, entre outros. A variedade de escolha – apesar de não ser vasta (e nem precisa ser) – garante que cada “Fenyx” criado pelos jogadores, nas diferentes plataformas, seja único.
Fórmula Ubisoft de gameplay
Quem está familiarizado com os games da desenvolvedora francesa, sabe que geralmente eles possuem uma estrutura de gameplay bem parecida. Em Assassin’s Creed, por exemplo, temos os pontos de observação que devem ser sincronizados para liberar acesso à partes do mapa do jogo. Em Immortals Fenyx Rising temos as gigantes estátuas dos deuses, que servem como ponto de observação e nos garantem uma visão ampla da ilha. Nesses pontos (que também servem de fast travel), podemos revelar baús, desafios, itens diversos e câmaras que devem ser exploradas. Essas câmaras funcionam como as Shrines de Breath of the Wild, onde devemos resolver puzzles diversos para obtermos itens valiosos que melhoram o status e habilidades de Fenyx.
Nosso herói é munido de uma espada (ataque leve), um machado (ataque pesado) e um arco. Durante o jogo, ao completar certos desafios ou encontrar baús, vamos adquirindo outras variações dessas armas com efeitos diversos nas batalhas. Além das armas, podemos equipar diferentes elmos e armaduras. Cabe a você montar um setup que se adeque à sua estratégia nas lutas travadas contra os inimigos. Contamos ainda com as Asas de Dédalo, que nos permitem planar, facilitando o acesso rápido a certas áreas do mapa, e as Braçadeiras de Héracles, que nos permite levantar, puxar e arremessar certos objetos.
No vasto e belo mundo que desbravamos, encontramos romãs, cogumelos azuis, figos olímpicos e néctar de flores. Acumulando uma certa quantidade desses itens, conseguimos preparar poções diversas para nos auxiliar no campo de batalha (vida, vigor, ataque e defesa). Todos os nossos equipamentos podem sofrer melhorias utilizando Fragmentos de Adamantina, na Forja de Hefesto. Nossa barra de vida e vigor também podem ser aprimoradas gastando, respectivamente, certa quantidade de Ambrosia e Raio de Zeus. Fenyx possui também uma árvore de habilidades, dividida em Perícias e Poderes Divinos que nos concedem golpes especiais. Completando alguns desafios obtemos Moedas de Caronte que podem ser trocadas por aprimoramentos diversos para essas habilidades.
Nas batalhas devemos alternar ataques leves e pesados para formar combos. A esquiva e a aparada (LB+RB) – uma espécie de parry – também possuem papel importantíssimo nas lutas. Usá-las no momento correto nos garante uma espécie de time break em que é possível desferir vários ataques nos inimigos sem chance de defesa ou revide. Assim como Link em Breath of the Wild, Fenyx pode escalar montanhas e monumentos diversos. Porém, tal qual o game que lhe serviu de inspiração, a ação consome barra de vigor. Convém mencionar que nadar, planar e utilizar os Poderes Divinos também as consome. Então, devemos usar tais habilidades de forma prudente.
Visual sensacional
A campanha principal segue uma premissa simples: encontre o ponto de observação, ache o templo do deus da região, recupere sua essência solucionando os puzzles das câmaras e ganhe “bênçãos” no processo. O Salão dos Deuses – situado no coração do Vale da Primavera Eterna – serve como um local seguro, onde reunimos os deuses resgatados, montamos poções e desbloqueamos melhorias. Apesar da história estar amarrada a uma certa linearidade, a exploração do mapa é livre. As missões secundárias e desafios são apresentados de forma orgânica, conforme desbravamos a Ilha Dourada. A ilha, por sinal, é belíssima e conta com transição de dia e noite. Assistir o nascer e pôr do sol em Immortals Fenyx Rising, é simplesmente maravilhoso! O jogo explora bem essa transição e certos itens e desafios só podem ser encontrados durante o dia, ou durante à noite. Mas, fique tranquilo que podemos alternar entre os ciclos a qualquer momento.
A exploração da ilha pode ser feita planando, a pé ou com uma montaria. O jogo te dá um leque bem vasto de animais que podem servir de companhia em nossa jornada e que após domados podem ser conjurados a qualquer momento segurando o botão Y. Eles apresentam um controle fácil e agradável, diferente de muitos jogos de mundo aberto onde montar e controlar o seu cavalo é algo burocrático e impreciso. Porém, apesar da montaria facilitar as idas e vindas pelo mapa, senti falta da possibilidade de golpear inimigos sob o cavalo, mas isso não chega a ser um problema.
Nos consoles da nova geração – como já virou tendência – temos a opção de alternar o Modo Gráfico entre Desempenho (que trava o jogo em 60fps) ou Qualidade (que dá prioridade para a resolução em tela). O visual é sensacional e os cenários são ricos e variados, assim como a fauna e flora presente no game. Não foram poucas as vezes que me peguei apreciando o visual da ilha dourada do alto de uma montanha ou estátua. As melodias orquestradas acompanham a qualidade visual e são muito bonitas, apesar de não memoráveis. Os controles são precisos e a movimentação é fluida, mas algumas poucas vezes apresenta screen tearing (quando o frame seguinte se sobrepuja ao anterior, desalinhando a imagem apresentada na tela). Immortals Fenyx Rising conta ainda com um Modo Fotografia para você eternizar certos momentos, curtir os cliques de outros jogadores e compartilhar os seus.
Um dos maiores acertos da Ubisoft
A história, apesar do mal iminente que ameaça o mundo, é leve e extremamente divertida. Uma grande marca dos deuses da mitologia é que eles não são retratados como seres perfeitos, padecendo das mesmas falhas e angústias que sofrem os seres humanos. O game explora muito bem isso no seu roteiro, fazendo ligações com diversas fábulas existentes. O jogo está todo localizado para o nosso idioma e a dublagem está bem legal. A construção de Fenyx, no entanto, me pareceu apressada e o personagem é caricato demais, se apresentando como a própria personificação clássica e estereotipada do herói. Nesse sentido, achei que faltou carisma a ele.
Immortals Fenyx Rising usa muito das mecânicas, visual e level design de Breath of the Wild, mas as utiliza de forma coesa e inteligente dentro de um mundo completamente diferente do desbravado por Link. Aqui o game é mais contido, sem tantas interações (praticamente os únicos NPCs que encontramos são os deuses) e não passa tanto a sensação de liberdade que experimentamos no jogo da gigante japonesa. Podemos dizer, obviamente, que Immortals Fenyx Rising se inspira em Breath of the Wild, mas possui dentro de sua proposta, uma identidade própria. Ou seja, não se trata de uma uma cópia pura e simples, mas algo novo que sintetiza num único lugar várias fórmulas de sucesso. Estamos diante de um dos maiores acertos do ano da Ubisoft e, quem sabe, o início de uma nova e longeva franquia.
Cópia de Xbox Series S cedida pelos produtores
Revisão: Jason Ming Hong