Nos últimos anos, os videogames foram, gradativamente, sendo dissociados da ideia de um produto com foco nas crianças. Os jovens, do início geracional desses eletrônicos, cresceram e a retórica por trás da publicidade mudou para alcançar um público mais velho. A maneira como esses produtos são consumidos, dessa forma, se adequaram ou criaram demandas para serem atraentes tanto para crianças, quanto adolescentes e adultos (de todas as idades). No entanto, a forma tradicional de se jogar videogame, com o uso de consoles ou de um PC, continuava sendo pouco democrática – por conta dos preços elevados desses produtos – até pelo menos o início dos anos 2000.
Popularização dos jogos de celular
A popularização dos celulares, em especial com o surgimento dos smartphones, impulsionou ainda mais a indústria de jogos e democratizou o acesso. Apesar de não trazerem ports de jogos da última geração de consoles, os títulos pensados para esses aparelhos e a possibilidade de jogar games antigos, via emulação, fazem dos celulares uma plataforma muito atraente. Afinal, hoje em dia, o número de pessoas com um aparelho em mãos é grande e, por conta da portabilidade, faz dele um bom companheiro para passar o tempo no intervalo da escola, do trabalho, em filas e por aí vai. O número de usuários de celulares ativos, no Brasil, chega a 118 milhões, por exemplo.
Em relatório de 2021, a Newzoo verificou que o faturamento dos jogos para celulares obteve lucro de quase R$ 500 bilhões mundialmente, superando o montante alcançado pelo mercado de jogos de PC e console juntos, naquele ano. Trata-se de um mercado dominado pelas gigantes Google e Apple. Do público gamer aqui no nosso país – algo em torno de 75% das pessoas – quase 50% dizem preferir jogar pelo celular. Tudo isso explica, por exemplo, um dos interesses da Microsoft em fechar a aquisição da Activision Blizzard, já que a sua divisão King – de jogos como Candy Crush – é um enorme sucesso.
Paradigma gamer
A simplicidade de muitos dos jogos para os celulares que, por vezes, remontam aos objetivos vistos em games antigos (como conquistar a maior pontuação), parecem ter criado fissuras que separam aqueles que consomem jogos por consoles, daqueles que consomem por celulares. Há, nesse sentido, um discurso preconceituoso que deslegitima o uso de celulares como plataforma de jogos. Afinal – dizem os críticos – é impossível experimentar jogos como The Legend of Zelda: Tears of the Kingdom, Street Fighter 6 e The Last of Us, nos celulares. Não teria como comparar esses mesmos títulos com os jogos por serviço dos dispositivos móveis, por mais que muitos destes já estejam também nos consoles, como Fortnite, PUBG e Genshin Impact.
No entanto, não são os visuais, mecânicas, level design e, principalmente, a arrogância daqueles que se sentem superiores – nutrindo a ideia de que há certa hierarquia dentro desse mercado – que ditam as regras do que é ou não um videogame. Não importa a limitação dos hardwares ou a simplicidade dos softwares, em comparação ao visto nos poderosos PlayStation 5 e Xbox Series X, por exemplo. É tudo videogame! Ainda assim, a Apple, no evento de apresentação do iPhone 15, no dia 12 de setembro, deu um pequeno passo na quebra desse paradigma gamer.
As especificações técnicas do novo hardware da empresa parecem permitir a conversão de títulos lançados e anunciados para os atuais consoles, diminuindo a fissura existente entre celulares e esses aparelhos. Jogos como Resident Evil 4 Remake, Death Stranding e o novo Assassins Creed foram mostrados rodando no iPhone 15 Pro, com a possibilidade, inclusive, de experimentá-los usando Ray Tracing durante a jogatina. Porém, como diz o ditado, todo bônus tem seu ônus. E isso pode ser evidenciado no valor exorbitante dos novos celulares da empresa da maçã, que varia de R$ 7.299 a R$ 13.999.
Salto geracional
No valor da versão mais poderosa do iPhone 15, a título de curiosidade, dá para comprar três PlayStation 5 e sete Nintendo Switch. Não que os aparelhos da Apple fossem baratos antes, sempre foram caros e focados num público específico. Mas, essas inovações nos permitem sonhar com novas possibilidades para o futuro do mercado móvel. Principalmente, em aparelhos com sistema Android. Talvez, seja o início de um novo salto geracional, com máquinas potentes, capazes de rodar jogos cada vez mais complexos bem na palma de nossa mão, de forma nativa. Com o equilíbrio nos preços desses celulares, podemos entrar numa nova era da indústria de videogames. Mas, como isso vai, de fato, impactar no mercado, só o tempo irá dizer.
Revisão: Julio Pinheiro