Quando se fala em simulador de fazenda, é quase automático pensar em Stardew Valley, Farming Simulator ou até Harvest Moon. Cada um com sua pegada, sua proposta, seu ritmo. Mas Farmer’s Life, do estúdio FreeMind S.A., chega com uma abordagem… diferente. Aqui, além de arar o solo e cuidar das galinhas — você também precisa lidar com as cicatrizes da guerra, um histórico de perdas familiares e com o vício em álcool que insiste em bater à porta.
Com uma proposta de mundo aberto, mecânicas de sobrevivência, criação de animais e uma liberdade quase total, o jogo tenta entregar uma experiência mais crua e realista da vida no campo. Mas será que consegue?
Desenvolvimento: FreeMind S.A.
Distribuição: PlayWay S.A., FreeMind S.A.
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Simulação
Classificação: 10 anos (Violência)
Português: Interface e Legendas
Plataformas: PC
Duração: 19 horas (campanha)
Entre enxadas e garrafas

Em Farmer’s Life, assumimos o papel de Kazimir, um veterano da Segunda Guerra Mundial que retorna para casa e encontra um cenário desolador: a fazenda da família em ruínas e nenhum parente à vista. O que resta é reconstruir tudo do zero enquanto luta contra seu próprio passado, seus fantasmas e o vício em álcool que, em alguns momentos, parece mais presente que o próprio personagem.
E esse detalhe não é só um pano de fundo narrativo. O alcoolismo influencia diretamente a jogabilidade, e cabe ao jogador decidir se quer enfrentar o problema ou se entregar a ele. Mas o jogo não te ajuda muito nessa decisão: se você opta por ficar sóbrio, Kazimir começa a resmungar sem parar, e chega um ponto em que você pensa em abrir uma garrafa só para fazer com que ele cale a boca. É triste, mas não deixa de ser engraçado ao mesmo tempo.
Cultivando relações (e frustrações)

Apesar do tom pesado, a rotina em Farmer’s Life é composta por tarefas bem conhecidas dos fãs do gênero: plantar, colher, criar animais, pescar, construir e vender. A cidade mais próxima serve como hub econômico, onde é possível negociar com NPCs e acompanhar o nível de “felicidade” que eles têm com você. Mas não espere muito carisma dos habitantes: o design dos personagens é pobre, os modelos são rígidos e ninguém tem voz — literalmente. Os sons que Kazimir emite são murmúrios que mais lembram um bug do que qualquer tentativa de atuação.
Ainda assim, o sistema de reputação com os NPCs ajuda a dar alguma vida à vila. Melhorando seu relacionamento, você ganha vantagens em negociações e desbloqueia algumas tarefas extras, mas nada muito profundo. As missões secundárias existem, mas não empolgam.
Simulador de clique

A agricultura em Farmer’s Life é provavelmente o ponto mais trabalhoso — e menos divertido — do início do jogo. Cada ação requer uma série de cliques repetitivos, tornando o cultivo e a construção cansativos logo de cara. É verdade que com o tempo, e com investimento nas ferramentas certas, tudo melhora. Contudo, o começo é arrastado e a curva de evolução é íngreme demais.
A movimentação dos animais não ajuda. Tentar arar a terra com o cavalo, por exemplo, é um exercício de paciência. O bicho se move como se estivesse com as patas engessadas e manobrar em linha reta é uma vitória por si só. Já o porco de estimação, que também funciona como guia nas tarefas iniciais, parece um brinquedo travado, com movimentos duros e sem expressão.
Um pouco de caos na calmaria

Apesar das limitações técnicas, Farmer’s Life tem ideias boas. A presença de mecânicas de sobrevivência, como a necessidade de comer, beber e dormir, é um acerto. Ao contrário de jogos onde basta ir dormir para passar o tempo, aqui é preciso administrar a saúde física de Kazimir com mais atenção, sob risco real de morte.
Outro ponto que merece destaque é a variedade de atividades disponíveis. Se cansar da lavoura, é possível se dedicar à criação de animais, à pesca, à coleta ou até mesmo à produção de bebidas alcoólicas, que podem ser vendidas ou consumidas. Há também a possibilidade de explorar áreas vizinhas, caçar e descobrir locais como igrejas abandonadas, bunkers e campos minados. Tudo isso dá um tom de sandbox interessante e mantém o jogo minimamente imprevisível.
Vale a pena?
Farmer’s Life é, no mínimo, curioso. Ele acerta ao tentar ir além do simulador tradicional, inserindo temas mais pesados e um sistema de sobrevivência funcional. Mas escorrega feio na parte técnica: controles travados, gráficos pobres, ausência de dublagem e um ritmo inicial desanimador comprometem a experiência.
Ainda assim, há algo de fascinante em acompanhar a jornada torta de Kazimir, entre uma colheita e um porre. Se você curte simuladores e não se incomoda com jogos mais crus e experimentais, pode valer a pena dar uma chance, nem que seja só para chamar um porco de amigo e sair por aí causando confusão.
Cópia de PC cedida pelos produtores
Revisão: Ailton Bueno