Talvez eu tenha uma missão pessoal que eu nem mesmo sabia: analisar todos os jogos de fazenda sempre que possível. Quando fico sabendo de algum game que vai me fazer pegar na enxada e plantar algumas sementes no solo do meu quintal, a vontade já bate à porta. Não foi diferente com Monster Harvest, ainda mais por ele trazer uma mistura ridiculamente inusitada com as mecânicas agrícolas: Pokémon e batalhas em turno. Mas o quanto essa loucura deu certo?
Desenvolvimento: Maple Powered Games
Distribuição: Merge Games
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Aventura, RPG, Ação, Simulação
Classificação: Livre
Português: Legendas e interface
Plataforma: PC, Switch, Xbox One, PS4
Duração: Sem registros
Plantas mutantes, eu escolho vocês
Monster Harvest tenta fugir um pouco do clichê em relação à história, e nos coloca na pele de um fazendeiro que, finalmente, não herdou um pedaço de terra do seu falecido avô, e nem tem memórias de infância naquela cidade. Temos simplesmente um “zé qualquer” que chega a uma pequena cidadezinha, e recebe a missão do cientista maluco Prof. Spark de cuidar da fazenda e ajudá-lo com seus experimentos sobre os Planimals. Assim começa nossa jornada mais do que bizarra, em busca de cultivar sementes comuns e adicionar gosmas em algumas delas para que sejam transformadas em monstros de batalhas em turnos. Nada convencional, eu diria.
Como todo bom jogo de fazenda, existem as sementes para plantarmos e ferramentas já bastante batidas: a enxada, o regador, o machado e a picareta. Respectivamente, esses equipamentos criarão buracos em seu loteamento, regarão suas plantas, cortarão árvores e quebrarão suas pedras. Digo, elas não farão nada por si só, mas é que você quem fará. Enfim, você entendeu.
Ainda trazendo inspirações claras de títulos deste universo, Monster Harvest permite com que algumas sementes sejam cultivadas em estações específicas do ano, que aqui são substituídas por elementos mais simples, como tempo úmido, seco e etc. Porém, a estrutura é a mesma, e são necessários cerca de 20 dias para que a alternância ocorra. Mas, é necessário ficar atento, já que o jogo não emite nenhum aviso e nem mesmo impede nosso erro, tornando-se possível lançar sementes não-cultiváveis em qualquer estação. Isso traz um bom nível de frustração, já que não é possível identificar o que plantamos depois de colocar tudo no solo. Com isso, algumas vezes me peguei dias regando à toa essas sementes até entender que não poderiam crescer naquela época.
Os Planimals
É aqui em que chegamos na parte mais bizarra e curiosa de todo o jogo: os Planimals. Para criar esses monstrinhos, precisamos utilizar Slimes (gosmas) de até três cores diferentes, cada qual com um efeito especial. Para adquirir esses itens, basta irmos até à caverna no norte extremo do mapa, cuja passagem fica desbloqueada apenas durante à noite – ou então esbarra com esses bichos gosmentos por aí. Neste local, podemos encontrar de tudo: itens, baús, minérios e, obviamente, os Slimes que são eliminados com um só golpe.
Uma vez lá, é possível enfrentar outros Planimals com nossa espada, a qual inicia uma batalha em turnos dando o primeiro deles para nós, caso atinjamos os inimigos com a arma. Se acabarmos encostando nesses Planimals inimigos antes de emitir um ataque, o primeiro turno é dele.
As batalhas são incrivelmente simples e soam até como algo feito às pressas e sem muita criatividade. Os cenários são sempre os mesmos, os gráficos são bem “pixelizados” por causa do zoom in da câmera, e os Planimals de nossa equipe possuem até três ataques, sendo dois deles desbloqueáveis com o passar dos níveis. Eliminando o inimigo, o Planimal em ação recebe experiência, possibilitando-o de subir de nível. Não é permitido trocar o monstrinho no momento da luta, nem fugir ou utilizar itens para nos ajudar a vencer a batalha ou recuperar a saúde: é batalhar ou batalhar, sem qualquer escolha.
Caso percamos nosso Planimal e deixemos com que morra, ele é eliminado para sempre (olha o Roguelike aí), mas em troca nos concede corações para serem utilizados em nosso terreno na fazenda, com o objetivo de torná-lo mais eficiente no crescimento das sementes. Além dos vários tipos de Planimals lutadores que podemos adquirir, também existem os domesticáveis como os em forma de galinhas, que são colocadas no celeiro, e os de montaria, que agem como cavalos e são criados no estábulo. Estes dois estabelecimentos são construídos através de receitas aprendidas com a simples “ação de realizar ações”. Ou seja, quanto mais você realiza crafting de objetos, mais receitas irá liberar.
Upgrades, eventos e cidadãos sociáveis
Novamente, como algo já bastante batido dos jogos de fazenda, podemos realizar upgrades nas ferramentas com dinheiro e minério. Fora isso, é claro que existe a pescaria, a qual aqui funciona de uma forma bastante direta, porém, bem interessante. Para fisgarmos peixes, basta pressionarmos o comando no momento certo de uma barra que fica transitando entre espaços vazios e pintados de verde. Uma vez apertado o botão quando ele encosta no espaço verde, temos uma taxa de 100% de sucesso ao massacrar o comando de puxar a linha.
Também há eventos marcados no calendário, estes que simplesmente são representados por imagens sem qualquer tipo de explicação. Porém, a interação com eles é bastante baixa, e todos resumem-se em apenas um local para comprar itens exclusivos e sementes únicas. Não são oferecidos minigames nem nada do tipo que seja marcante ou diferente para quebrar o ciclo de jogabilidade.
Fora isso tudo, temos os habitantes da cidade. Todos possuem um coração acima de suas cabeças e, fazendo amizade com os personagens certos mantendo sempre uma relação de “dar presente diariamente”, é possível receber até mesmo descontos em suas respectivas lojas. Não é nada que incentive tanto a construir uma amizade para com eles.
Ah, e caso você seja alguém tão preguiçoso quanto eu, pode ir preparando suas automatizações para fazer com que sua fazenda prospere sozinha. Podemos realizar o crafting de itens também para realizar as tarefas maçantes do dia-a-dia no campo, como regar as benditas plantas todos os dias sem nossa ação humana.
Bugs e uma interface pra lá de confusa
Apesar de bastante interessante, Monster Harvest teve um lançamento bastante conturbado e desastroso por causa de sua quantidade de bugs e game design duvidoso. Entrei em contato com os produtores, e eles nos avisaram que um pacote de atualizações viria logo após o lançamento do jogo para corrigir todos os problemas encontrados. A questão é que a atualização realmente veio, porém, os defeitos continuam firmes e fortes.
A interface é uma das coisas mais confusas que já vivenciei em videogames. A navegação entre ela não é nada intuitiva, além de que não existe nenhuma explicação do que cada botão faz. Até agora não sei se existe uma forma eficiente de descartar itens, por exemplo, e toda vez preciso mover o qual desejo jogar no lixo de forma manual, para depois ir até o ícone da lixeira e confirmar a ação. Porém, isso se agrava e muito caso nossa mochila esteja cheia e tenhamos acabado de encontrar um item bacana no chão, seja na caverna ou após uma vitória contra algum Planimal. Boa sorte descartando itens rapidamente para que os no chão não desapareçam para sempre depois de alguns segundos.
Elementos originados da versão de PC também estão claramente presentes aqui, como alguns botão de fechar janelas no canto delas sem qualquer botão identificando a ação de fechá-las. Claramente, alguém esqueceu de que não jogamos nos consoles utilizando mouse e teclado – pelo menos, na maioria dos jogos. O texto também é semi-impossível de ser lido em vários momentos, como a descrição de itens em lojas. No modo portátil fica pior ainda, já que na TV em 1080 posso simplesmente chegar mais perto da imagem – mas o desconforto é grande.
Por fim, há formas de ficarmos travados em locais nos quais não deveríamos poder andar por, Planimals inimigos normalmente ficam travados em objetos no chão mostrando a terrível inteligência artificial existente aqui, as batalhas possuem uma precisão muito ruim na escolha de golpes e navegação entre opções e, o pior de todos os bugs, sem dúvidas, é perder a montaria Planimal. Esse último me fez sentir uma frustração fora do normal, já que, ao cavalgar em minha montaria até a cidade e entrar em uma casa ou loja, faz com que seu Planimal simplesmente desapareça e você o perca como se nunca o tivesse tido.
Boas ideias exigem boas execuções e polimento
Monster Harvest é dotado de uma ideia extremamente interessante: jogos de fazenda e Pokémon. A proposta me divertiu bastante durante horas, porém, a quantidade de bugs existente no jogo me fez passar por momentos de raiva intensos. Além disso, a falta de polimento em sua interface como um todo é bem grave, e traz vários erros cometidos por mim de forma acidental constantemente, como vender algo que eu não queria por selecionar a ação errada e os botões funcionarem numa espécie de “modo turbo”.
Apesar de empolgar, o indie é uma prova muito grande de que não você ter boas ideias, mas se faz necessário executá-las com cuidado e carinho, além de lançar seu produto o mais polido possível. Monster Harvest é divertido, porém, mal polido de uma forma absurda, tanto que fica difícil indicá-lo mesmo em uma promoção bem generosa.
Cópia de Switch cedida pelos produtores