Os carismáticos Miis surgiram como avatares personalizáveis dos usuários no popular Nintendo Wii. Era uma forma do jogador idealizar a si mesmo dentro do sistema do console da gigante japonesa, e foi com eles que os felizes donos do Wii puderam experimentar o fenômeno Wii Sports. O sucesso foi imenso e incentivou, por exemplo, a Microsoft a tentar algo parecido, mas sem o mesmo carisma. Com o passar do tempo, os avatares passaram a ser utilizados como base dos recursos de redes sociais dos sistemas do WiiU e 3DS, no já descontinuado Miiverse. Em 2017, os Miis ganharam uma aventura própria no portátil 3DS: Miitopia. Apesar da recepção morna na época, o jogo foi adaptado e lançado agora em maio também para o Nintendo Switch.
Desenvolvimento: Nintendo
Distribuição: Nintendo
Jogadores: 1 (local)
Gênero: Aventura, RPG
Classificação: Livre
Português: Não
Plataformas: Switch
Duração: 29.5 horas (campanha)/65 horas (100%)
Recupere as faces roubadas
Todos os Miis viviam em paz e harmonia num mundo fantástico conhecido como Miitopia. Certo dia, uma entidade maligna conhecida como Dark Lord quebrou a tranquilidade do lugar. O vilão passou a roubar as faces dos Miis e colocá-las em suas criações monstruosas. Em meio ao caos surge um herói que deve partir numa jornada para acabar com os planos malvados de Dark Lord, recuperar as faces roubadas dos Miis e restaurar a utopia Mii em Miitopia. Como é possível de perceber, a narrativa é simples e o clima é bem leve e descontraído. Ao longo de toda história lidamos com diálogos que são irônicos e engraçadinhos – uma lástima a Nintendo não investir numa localização para o nosso idioma.
A ambientação remonta de forma simples a era medieval. Os cenários são bem variados, divertidos e coloridos, mas contém poucos detalhes. Tudo casa com a simplicidade que os avatares representaram desde a sua criação. Dessa forma, o design, apesar de simples, é bonito e faz sentido dentro da proposta do jogo, ficando dentro do esperado. A progressão é lateral livre, parecida com a vista em jogos Beat ‘em Up. Todos os personagens, do herói ao vilão, são editáveis, e isso quer dizer que a sua aventura em Miitopia será única. Caso você queira, há a opção de utilizar o visual pré-definido para os personagens, mas, isso retira boa parte do charme do jogo.
Meu primeiro RPG
Miitopia, para todos os efeitos, é um RPG por turno. Porém, não espere algo complexo e com mecânicas variadas, ao estilo Dragon Quest ou Final Fantasy da vida. O jogo utiliza demais a automatização dos comandos na gameplay. Imaginem um Xenoblade Chronicles super, hiper, mega simplificado. Imaginaram? É mais que isso! Toda a gameplay se resume a apenas um passeio interativo. Algo interessante se você for uma criança, mas se torna enfadonho e repetitivo depois de algumas horas de jogo, caso seja um adulto. Miitopia, por conta de sua pegada mais casual, pode muito bem ser uma espécie de “meu primeiro RPG” para os menores.
O único personagem que controlamos minimamente é o herói, que representa o nosso próprio avatar. Todos os demais integrantes da equipe (podemos contar com três amigos e um cavalo) são controlados automaticamente. Até mesmo durante a exploração, a movimentação é feita de forma automática, como se fosse um jogo on-rails (“nos trilhos”, sem tanta influência do jogador). Apenas nos poucos vilarejos, onde devemos devolver as faces roubadas, é que podemos controlar nosso Mii livremente pelo cenário. Nesse sentido, o jogador deve focar muito mais no gerenciamento de equipamentos e status do que na exploração dos cenários e batalhas em si.
Dos temperos a pousada
Ao longo da aventura, algumas poucas variações nas mecânicas vão sendo implementadas, como os potinhos de tempero que restauram energia (HP), magia (MP), morte etc. A mesma coisa acontece nos locais seguros dentro das batalhas. Se você posicionar um Mii de sua equipe nesse local, ele recupera energia e barra de magia. A cada cinquenta faces resgatadas, esses elementos vão sendo melhorados, facilitando ainda mais a pouco desafiadora jornada. Nas batalhas, como já dito, apenas podemos selecionar a ação de nosso avatar. Podemos atacar, usar uma magia/golpe especial e utilizar itens que recuperam HP (banana) ou MP (balas). Ao final do embate, como em todo RPG, ganhamos pontos de experiência e um pouco de dinheiro.
Miitopia conta, inicialmente, com seis classes (profissões) e conforme avançamos, outras seis (das mais malucas possíveis) dão as caras. Cada classe possui armas e vestimentas próprias, assim como golpes específicos. A liberdade para alternar entre as classes, no entanto, é implementada muito tardiamente. A exploração do mapa, como todo o jogo, é limitada. Marcações de locais que podemos visitar são adicionadas e ao entrarmos lá, o máximo que podemos fazer, salvo batalhar, é escolher pequenas variações de caminhos que podem nos levar a um baú de tesouro ou a uma armadilha.
No final da trilha sempre topamos com uma pousada, onde podemos recuperar nossas energias e gerenciar nossa party. A pousada é dividida em cômodos que abrigam até duas pessoas e um estábulo. Ficar no mesmo cômodo de um certo Mii aumenta a afinidade dos personagens, o que pode fortalecer seus golpes ou gerar alguns combos durante as batalhas. A mesma dinâmica se aplica ao cavalinho que nos acompanha: ficar no estábulo junto a ele aumenta a afinidade e permite golpear montado.
É nas pousadas que podemos comprar novas armas e vestimentas para nossos personagens. Mas, a compra não é livre. Depende se o Mii deseja ou não adquirir um novo equipamento, fazendo o sistema de progressão ser desnecessariamente randômico. As refeições que também fazemos por lá aumentam nossos atributos (energia, força, magia etc) e melhoram a eficiência nas batalhas. A pousada ainda abriga dois minigames, que podem ser jogados com tickets específicos que ganhamos conforme avançamos. O primeiro é uma roleta da sorte e o segundo é um papel-pedra-tesoura que pode nos valer uma premiação em dinheiro.
Fator social limitado
O fator social que faz parte da gênese dos avatares também é visto aqui, mas de forma limitada. Uma das coisas mais legais de Miitopia – e que me fez gastar um bom tempo nele – é a criação de personagens. Tudo que os donos de um console Nintendo, desde o Wii, conhecem para montagem do avatar está no jogo. Como já antecipei, todos os personagens presentes em Miitopia são editáveis. Os donos de Amiibos ainda podem resgatar Miis personalizáveis. Essa foi uma das poucas vezes que fiquei tentado a adquirir um Amiibo, e tenho certeza que muitos irão comprar os bonecos só para resgatar um avatar personalizado, ou seja, jogada de mestre da Nintendo.
Tudo que você cria pode ser compartilhado com a comunidade através de um código específico, mas, aí começam os problemas: não existe uma ferramenta de busca para esses códigos. O máximo que podemos fazer é importar os avatares dos amigos de nossa lista no console (desde que os mesmos não estejam bloqueados). Em linhas gerais, seja para compartilhar o nosso código ou resgatar um código dos Miis criados pela comunidade, há a necessidade de uma rede social externa ao Switch, e não é algo integrado ao jogo em si. E isso poderia ser facilmente resolvido se o Miiverse ainda existisse. Para piorar ainda mais, não podemos curtir a aventura com os amigos, pois não há um multiplayer local ou online. Uma pena, já que jogar com outras pessoas tornaria a experiência bem mais atraente.
Cansativo com o tempo
A grosso modo, por mais que seja divertido explorar a construção de versões caricatas de nós mesmos ou de qualquer outro que vier à nossa mente, a experiência com Miitopia se torna cansativa com o tempo. A fórmula é repetida até a exaustão e enjoa fácil. Chega um momento que você pensa: “não acredito que vou ter que passar por tudo isso outra vez”.
Reitero que, dada a casualidade de suas mecânicas, o jogo seja uma porta de entrada para o gênero de RPG como um todo. Para as crianças que ainda estão aprendendo a lidar com comandos complexos e que não conseguem acompanhar as nuances narrativas de um Persona, por exemplo, Miitopia pode ser uma alternativa atrativa. Mas, nada impede do jogo conseguir despertar a curiosidade de marmanjos, como esse que vos escreve.
Cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Jason Ming Hong