Em meados dos anos 90, a Sony começou a disputar espaço na indústria de games ao lançar o PlayStation. Em 1996, numa época em que as grandes empresas do ramo possuíam personagens associados a sua marca, a Naughty Dog foi a responsável por desenvolver um jogo de plataforma, com visual 3D, com um personagem principal que acabou se transformando no mascote do poderoso console da Sony. O jogo em questão era Crash Bandicoot.
A associação, no entanto, foi um tanto quanto curta. Pois, a partir do The Wrath of Cortex, de 2001, o marsupial “malucão” deu as caras em outras plataformas. Ainda assim, os três primeiros jogos da franquia são marcantes. E, por um tempo, seus jogos foram sinônimo de PlayStation. Confesso que até hoje acho estranho ver o personagem aparecendo em outros consoles, tão estranho quanto ver o Sonic na Nintendo.
Pegando carona na onda de remasters e remakes, que assombraram a oitava geração de consoles, a Activision trouxe uma competente coletânea, contendo justamente a trilogia clássica, com o visual repaginado. Diante do sucesso do game, os títulos que vieram após a era PlayStation foram deixados de lado e uma continuação direta da terceira aventura de Crash começou a ser desenvolvida pela Toys for Bob. Lançado no ano passado para PS4 e Xbox One, Crash Bandicoot 4: It’s about Time chegou no início de março, para Nintendo Switch, junto com a otimização para os consoles da nova geração. E a versão do PC foi lançada via Battle.net no final do mesmo mês.
Desenvolvimento: Toys for Bob
Distribuição: Activision
Jogadores: 1-4 (local)
Gênero: Plataforma
Classificação indicativa: 10 anos
Português: Legendas, interface e dublagem
Plataformas: PC, PS4, PS5, Switch, Xbox One e Xbox Series X/S
Duração: 10 horas (campanha)/27 horas (100%)
Adaptação competente
Como dono de um finado Nintendo Wii, uma das coisas mais tristes para mim era ver os ports mal feitos para o console. Os jogos, geralmente, eram completamente diferentes das versões existentes na época para PS3 e Xbox 360. Poucos conseguiram se safar desse trágico destino. Por mais que visualmente muitas adaptações para o Switch não sejam um primor, o híbrido vêm recebendo competentes ports que o afasta daquele passado nebuloso do Wii.
Jogos como Ori, Doom, MK 11, The Witcher 3 e Cuphead, apesar de não serem unanimidade, são só alguns exemplos de adaptações bem feitas para o console. Mesmo apresentando downgrade (em grande parte na resolução e framerate), para todos os efeitos, o conteúdo desses jogos é exatamente o mesmo. Nesse sentido, Crash 4 se enquadra nessa lógica. É um jogo que obviamente possui uma qualidade visual inferior à versão do PS4. Mas, a de Switch consegue entregar, de forma competente, uma experiência similar a que os donos dos consoles mais poderosos possuem, com todos os conteúdos e o direito a jogar deitado na cama.
Crash Bandicoot 4: It’s About Time apresenta uma resolução dinâmica de até 720p no modo dock e cerca de 540p no modo portátil. Em ambos os casos, o framerate se mantém em boa parte do tempo estável em 30fps, apresentando alguns pequenos engasgos e lags, principalmente quando há muitos elementos em tela. A resolução mais baixa fez com o jogo apresentasse um visual mais escuro em comparação às outras versões, alguns efeitos em objetos do cenário e inimigos – como sombras, por exemplo – foram diminuídos ou embaçados. Ainda assim, encaro o trabalho de adaptação para o Switch com bons olhos e acredito que essas limitações não ofusquem o seu brilho.
Viajando pelo tempo
Crash Bandicoot 4: It’s About Time traz boa parte da trupe dos jogos clássicos de volta. A história brinca com a já batida temática de viagem no tempo. No jogo, Neo Cortex e N. Tropy escapam da prisão ao descobrirem uma fenda temporal. Após passar a perna no vilão cabeçudo, N. Tropy cria um dispositivo que consegue controlar as fendas no espaço-tempo e começa a vagar por várias dimensões e eras diferentes. Com isso, cabe a Crash e Coco Bandicoot – com a ajuda de quatro máscaras quânticas – restabelecer a ordem.
Por padrão, podemos optar por jogar com Crash ou Coco. Para todos os efeitos o controle dos dois é muito parecido, com pulos duplos e golpe giratório. Porém, ao longo de nossa jornada vamos encontrando outros personagens pelo caminho. Alianças improváveis são formadas e novas possibilidades de gameplay se abrem nas fases. Além disso, as máscaras quânticas liberam habilidades diferentes para os Bandicoots criando situações inusitadas pelas fases: com o poder de Lani-Loli os marsupiais conseguem fazer com que plataformas e itens apareçam ou desapareçam; Akano concede aos heróis um poderoso golpe giratório que destrói caixas resistentes e permite pulos mais longos; com o poder de Kupuna-Wa podemos desacelerar o tempo; e Ika-Ika nos permite alterar a gravidade.
Supere os obstáculos pelo caminho
Crash Bandicoot 4: It’s About Time é dificílimo, mas ao mesmo tempo prazeroso. Ele retoma a velha mecânica de tentativa e erro dos jogos mais antigos, mas refina a fórmula. Existem, na verdade, dois estilos de gameplay. No moderno (padrão) cada morte é contabilizada e sempre voltamos ao último ponto de controle até conseguir terminá-la. Não importa se você morrer cem vezes na partida: o jogo continua. Já no retrô as coisas ficam mais próximas aos primeiros games. Iniciamos a fase com quatro vidas. Perdeu todas? Comece a fase toda novamente. Nos dois casos, o contador de morte fica nos assombrando e desafiando a superar os obstáculos pelo caminho.
Crash Bandicoot 4: It’s About Time mantém a mesma estrutura de fases organizadas por mundos temáticos, assim como os primeiros jogos. O quarto título da franquia conta com mais de 40 fases, sem contar o modo N. Verted e as fases extras desbloqueáveis ao conseguirmos coletar fitas pelos mundos (que exige zero mortes pra isso). Todos os elementos aos quais estamos habituados estão lá: as caixas de frutas, com ponto de interrogação, TNT, Nitro e por aí vai. Ao completarmos as fases, joias são desbloqueadas conforme nosso progresso na mesma (percentual de frutas coletadas, completar o nível com um número específico de mortes etc). Conseguir todas as joias numa fase aumenta ainda mais a dificuldade e, como “pagamento” para nosso masoquismo, conseguimos liberar visuais diferentes para Crash e Coco.
O game conta também com um modo competitivo local para até quatro jogadores: Combo de Caixa ou Corrida ao Ponto de Controle. O interessante é que não há a necessidade de termos outros controles à nossa disposição. Perdeu? É só passar o controle, assim como era antigamente. Tudo é feito com um único joystick. Apesar da simplicidade do modo e de apenas agregar um pouco mais de conteúdo, seria interessante termos a opção de jogarmos online. De toda forma, o modo história é mais do que o suficiente para nos prender por um bom tempo. Ainda mais para aqueles que gostam de completar todas as fases com 100%.
Level design inteligente e diversificado
Mesmo com a limitação no Switch, Crash Bandicoot 4: It’s About Time é muito bonito. Ele conta com rápidas telas de carregamento e possui uma trilha sonora leve e alegre. Apesar das longas fases cansarem um pouco, o jogo possui um level design inteligente e diversificado que impede que a nossa experiência com ele seja repetitiva. Os trechos sobre trilhos e as grandes fugas são maravilhosas, diga-se de passagem.
Para a nossa felicidade o game conta com legendas e dublagem em português do Brasil. Crash Bandicoot 4: It’s About Time é difícil como poucos atualmente, mas divertido e um passeio ao passado, tanto da série quanto para os jogos de plataforma como um todo.
Cópia de Switch cedida pelos produtores
Revisão: Jason Ming Hong